A Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8429/1992) não é extensa, mas possui um enorme volume jurídico interpretativo, razão pela qual hoje restringir-me-ei a falar do Artigo 11, inciso II desse diploma legal, que assim reza:
Art. 11. Constitui ato de improbidade administrativa que atenta contra os princípios da administração pública qualquer ação ou omissão que viole os deveres de honestidade, imparcialidade, legalidade, e lealdade às instituições, e notadamente:
II – retardar ou deixar de praticar, indevidamente, ato de ofício;
O dispositivo acima transcrito está no rol dos Atos de Improbidade Administrativa que Atentam contra os Princípios da Administração Pública, da Lei 8429/1992, a qual possui ainda outros dois róis, quais sejam Atos de Improbidade Administrativa que Importam Enriquecimento Ilícito (Art. 9º.) e Atos de Improbidade Administrativa que Causam Prejuízo ao Erário (Art. 10).
O que estou trazendo à discussão aqui, portanto, não é qualquer ato de improbidade administrativa que se traduza em enriquecimento ilícito por parte do agente ou que ainda que não haja tal ilicitude, mas acarrete prejuízo ao erário.
O que trago à baila é a ignorância a Princípios da Administração Pública, residente em retardar ou deixar de praticar ato de ofício.
Na hipótese sob comento, a improbidade administrativa pode ser caracterizada independentemente da intenção do agente público agir em interesse próprio ou de terceiro, mas vem crescendo a corrente jurisprudencial que entende pela subjetividade deste regramento, vez que a ação ou omissão sempre têm um motivo, justificável ou não.
Caso a motivação do agente público seja justificável, é possível a interpretação de que apesar de retardar ou deixar de praticar algum ato administrativo, ele não tenha cometido improbidade administrativa.
Nas palavras do Ministro Herman Benjamin, do STJ, a “Lei de Improbidade Administrativa não visa punir o inábil, mas sim o desonesto, o corrupto, aquele desprovido de lealdade e boa-fé”. O que o eminente magistrado quis dizer com suas sábias palavras, foi que é necessário que a conduta do agente seja dolosa e provida de má-fé.
Neste sentido foi o entendimento do Tribunal de Justiça de Santa Catarina nos autos da Apelação Cível n. 0013319-95.2005.8.24.0008, de relatoria do Desembargador Carlos Adilson Silva. Observe: Apelação Cível. Ação Civil Pública por Improbidade administrativa. Processual Civil. […] Mérito Recursal. Ex-Prefeito do Município de Blumenau. Ausência de repasse da contribuição patronal e dos valores recolhidos das folhas de pagamento dos servidores públicos ao ISSBLU – Instituto Social de Seguridade dos Servidores de Blumenau. Encargo moratório de elevada monta decorrente do inadimplemento. Decisão do Tribunal de Contas concluindo pela ausência de efetivo prejuízo patrimonial ao erário, a despeito da ilegalidade. Inocorrência de ato ímprobo previsto no Art. 10 da Lei n. 9.429/92. Não configuração, ademais, de dolo ou má-fé no tocante à violação aos princípios da administração pública. Elemento subjetivo não evidenciado, imprescindível à caracterização do ato de improbidade administrativa previsto no Art. 11 da LIA. Condenação afastada. Sentença reformada. Recurso provido.
Na mesma toada decidiu o Tribunal de Justiça de São Paulo: AÇÃO CIVIL PÚBLICA – IMPROBIDADE ADMINISTRATIVA – Ex-prefeito do Município de Tatuí – Atraso no repasse das contribuições previdenciárias patronais entre os meses de maio e dezembro de 2012 – Celebração de acordo para pagamento dos débitos previdenciários – Parcelamento que se pautou pela legalidade, nos termos da lei municipal regente (Lei Complementar nº 006/2009)- Regularidade da conduta do réu reconhecida pelo Tribunal de Contas do Estado, Ministério Público e Ministério da Previdência Social – Verbas utilizadas para pagamentos no âmbito da própria administração pública – Alocação da dotação orçamentária – Ausência de dolo, culpa, má-fé ou violação aos preceitos da administração pública – Inexistência de prova de enriquecimento ilícito e prejuízo ao erário – Ato ímprobo não configurado – Sentença reformada, para julgar improcedente o pedido – Recurso provido (TJSP, Apelação Cível 1004914-42.2015.8.26.0624, Rel. Des. Maria Laura Tavares, j. 18/03/2019).
Concluo, assim, informando aos leitores que a (suposta) improbidade administrativa capitulada no Art. 11, II da Lei 9429/1992, precisa ser apurada de forma específica, caso a caso, para que seja verificada a presença ou não de dolo e má-fé por parte do agente público, não cabendo, portanto, a condenação à luz da literalidade da lei.