Uma novidade vivenciada por muitos na atual pandemia de Covid-19 é a realização do ensino à distância para as classes de ensino fundamental.
Inicialmente vale destacar que a legislação em vigor prevê a obrigatoriedade do ensino fundamental, com duração de nove anos, início aos seis anos de idade e tem por objetivo a formação básica do cidadão. Descreve ainda que o ensino fundamental será presencial, sendo o ensino à distância utilizado como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais.[1]
Pois bem. Evidente que passe pela cabeça de muitos a legalidade da medida implementada quando, diante do surto de coronavírus, muitas escolas, por assim dizer, tenham apresentado a proposta de ensino à distância como meio de cumprir o calendário escolar. Todavia a realidade não é bem esta.
O Decreto que regulamenta o ensino à distância (EAD) de fato contempla a possibilidade do ensino fundamental receber conteúdo via meios digitais, validando sua utilização, contudo, traz em seu bojo o rol taxativo, ou seja, definido, das situações em que poderia ser aplicado.
Por breve leitura do texto legal vê-se que não se encontra normatizada a possibilidade de ensino à distância em decorrência de fatos imprevisíveis (como é o caso da pandemia vivenciada) onde haja interrupção do ensino presencial [2].
As hipóteses previstas em lei não abarcam a possiblidade de ensino à distância a crianças em decorrência de caso fortuito ou de força maior (que é como tem sido tratada a presente pandemia). Quando muito, seria admissível em casos em que o aluno estivesse impedido, por motivos de saúde, de acompanhar o ensino presencial e, talvez, seria nessa vertente que muitos se apoiariam (a meu ver de forma equivocada) para adoção da medida excepcional.
Imperioso ainda destacar que nem mesmo a PORTARIA 343 do MEC pode ser interpretada de forma extensiva e com o objetivo de aplica-la ao ensino fundamental, uma vez que, dispõe de forma clara que a excepcionalidade ali tratada é relacionada às instituições de ensino superior.[3]
Por fim, vale destacar que diante da incerteza dos acontecimentos e da ausência de previsão quanto à paralisação das aulas e, com o fim precípuo de não causar prejuízo aos alunos, é possível que haja alguma alteração ou elasticidade da lei para atribuir legalidade ao ensino à distância voltado a ensino fundamental enquanto durar a pandemia.
[1] LDBE – Lei nº 9.394 de 20 de Dezembro de 1996Estabelece as diretrizes e bases da educação nacional.
Art. 32. O ensino fundamental obrigatório, com duração de 9 (nove) anos, gratuito na escola pública, iniciando-se aos 6 (seis) anos de idade, terá por objetivo a formação básica do cidadão, mediante: (Redação dada pela Lei nº 11.274, de 2006)
§ 4º O ensino fundamental será presencial, sendo o ensino a distância utilizado como complementação da aprendizagem ou em situações emergenciais.
DECRETO No – 9.057, DE 25 DE MAIO DE 2017
[2] Art. 9º A oferta de ensino fundamental na modalidade a distância em situações emergenciais, previstas no § 4º do art. 32 da Lei nº 9.394, de 1996, se refere a pessoas que: I – estejam impedidas, por motivo de saúde, de acompanhar o ensino presencial; II – se encontrem no exterior, por qualquer motivo; III – vivam em localidades que não possuam rede regular de atendimento escolar presencial; IV – sejam transferidas compulsoriamente para regiões de difícil acesso, incluídas as missões localizadas em regiões de fronteira; V – estejam em situação de privação de liberdade; ou VI – estejam matriculadas nos anos finais do ensino fundamental regular e estejam privadas da oferta de disciplinas obrigatórias do currículo escolar.[2]
[3] PORTARIA Nº 343, DE 17 DE MARÇO DE 2020
Dispõe sobre a substituição das aulas presenciais por aulas em meios digitais enquanto durar a situação de pandemia do Novo Coronavírus – COVID-19.
O MINISTRO DE ESTADO DA EDUCAÇÃO, no uso da atribuição que lhe confere o art. 87, parágrafo único, incisos I e II, da Constituição, e considerando o art. 9º, incisos II e VII, da Lei nº 9.394, de 20 de dezembro de 1996, e o art. 2º do Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017, resolve:
Art. 1º Autorizar, em caráter excepcional, a substituição das disciplinas presenciais, em andamento, por aulas que utilizem meios e tecnologias de informação e comunicação, nos limites estabelecidos pela legislação em vigor, por instituição de educação superior integrante do sistema federal de ensino, de que trata o art. 2º do Decreto nº 9.235, de 15 de dezembro de 2017.