A Lei Complementar nº 87/1996, conhecida como Lei Kandir, estabelece normas gerais do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS), de competência dos Estados e do Distrito Federal. Nela está previsto que se considera ocorrido o fato gerador do ICMS no momento da saída de mercadoria de estabelecimento de contribuinte, ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular.
Entretanto, o Supremo Tribunal Federal (STF), no julgamento da Ação Declaratória de Constitucionalidade (ADC) 49, declarou a inconstitucionalidade dos artigos 11, parágrafo 3º, inciso II, 12, inciso I, no trecho “ainda que para outro estabelecimento do mesmo titular”, e 13, parágrafo 4º, da Lei Complementar 87/1996.
Dessa forma, o STF entendeu que não há incidência do ICMS sobre a transferência de mercadoria de um estabelecimento para outro de mesma titularidade porque não há transferência de posse ou propriedade, apenas o deslocamento físico. Portanto, não há circulação jurídica da mercadoria, o que afasta a obrigação tributária.
A decisão proferida na última semana está de acordo com a tese firmada pelo próprio STF no julgamento do Recurso Extraordinário com Agravo (ARE) 1255885, em agosto de 2020, no sentido de que “não incide ICMS no deslocamento de bens de um estabelecimento para outro do mesmo contribuinte localizados em estados distintos, visto não haver a transferência da titularidade ou a realização de ato de mercancia”.
Ora, o tributo não incide sobre a mercadoria, mas sobre sua circulação, de forma que as operações mercantis com a circulação jurídica dos bens, vale ressaltar, a transferência de posse ou da propriedade, são condição para fazer incidir o ICMS sobre a operação. A reiterada jurisprudência, não só do próprio STF, reconhece que a mera circulação física da mercadoria não gera a obrigação tributária de pagamento do ICMS. Observe-se que o fato de estarem os estabelecimentos de mesma titularidade em Estados diferentes não é relevante para fazer nascer a obrigação tributária, de modo que não deve incidir o ICMS sobre o deslocamento de mercadorias entre estabelecimentos do mesmo titular em unidades federativas diferentes.
Dessa forma, solidifica-se o afastamento da exação sobre a circulação simplesmente física ou econômica de mercadorias, o que poderá desonerar o contribuinte possuidor de vários estabelecimentos.
Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES.