Ainda tido por muitos como o país do futebol pelos grandes feitos internacionais conquistados pela Seleção ao longo da sua história, o Brasil congrega cerca de 656 times de futebol profissional e envolve 0,72% de todo seu PIB, cerca de R$ 52,9 bilhões de reais segundo estudo realizado antes da pandemia da Covid-19 pela multinacional Ernst & Young, a pedido da Confederação Brasileira de Futebol (CBF).
Grande parcela deste total de clubes está endividada. Uns com a situação sob controle e outros realmente à beira do colapso econômico e financeiro que se potencializou pelos nefastos efeitos da pandemia, pois, com estádios fechados ou funcionando sem público se perdeu em venda de ingresso e patrocínio, os quais respondem por expressiva parcela da sua receita, o que veio agravar ainda mais uma situação de penúria que já durava anos.
Mesmo que para muitos deles o cenário econômico seja ruim, o modelo de associação civil adotado representa quase que sua totalidade, e isso gera obstáculo à formulação do pedido de recuperação judicial. Neste sentido, tem-se que apenas 3 dos 40 clubes que disputaram as séries A e B do Campeonato Brasileiro de 2020 tinham formato empresarial: o Red Bull Bragantino, o Cuiabá e o Botafogo de Ribeirão Preto (Botafogo-SP), mas este foi rebaixado para a série C.
É bem verdade que entidades sem fins lucrativos vêm ganhando espaço na cena de “legitimados” que podem pedir a recuperação judicial, sendo o Figueirense Futebol Clube exemplo disto em recente decisão proferida pelo Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul. A importante tese que permite esta interpretação é aquela que diz que mesmo sendo entidade sem fins lucrativos, como as associações, comprovando-se, dentre outros requisitos exigidos, o exercício da atividade econômica e social com produção de riqueza, estar-se-ia fora do alcance da literalidade do artigo 1º, da Lei nº 11.101/2005, que limitaria a possibilidade destes pleitos unicamente aos empresários e às sociedades empresárias.
Portanto, e respondendo à indagação feita no título deste ensaio, embora seja possível, não há segurança jurídica concreta à tese que permite que clubes de futebol solicitem em juízo a concessão de recuperação judicial, cumprindo-se ao Congresso Nacional o papel de editar legislação regulando a matéria em definitivo, para evitar as antinomias interpretativas que sobre ela orbitam perante o atual ordenamento jurídico.
Acreditamos que nesta direção o “pontapé” inicial já foi dado por intermédio do Projeto de Lei (PL) nº 5.516/2019, aprovado no mês passado pelo Senado Federal e que busca incentivar os clubes de futebol a se transformarem em empresas, profissionalizando-os com a tipificação de Sociedade Anônima do Futebol (SAF), o que lhes permitiria a expressa legitimidade de pedir a recuperação judicial.
Raphael Wilson Loureiro Stein é Associado do Escritório desde abril de 2019 e atua nas áreas: Contencioso Civil, Comercial e Recuperação de Empresas e Falência.
Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/07/clube-de-futebol-no-brasil-pode-pedir-recuperacao-judicial/