Ontem o meu colega de Escritório, David Roque Dias, publicou neste Direito ao Direito um artigo com ótima análise jurídica sobre o julgamento que envolveu a disputa, entre esposa (união estável) e caso fora da relação conjugal, de pensão de homem falecido. O STF, como o David explicou, rejeitou o pedido de divisão da pensão do INSS feito pela pessoa que mantinha relação extraconjugal com o falecido.

Vou acrescentar alguns outros aspectos ao assunto!

O julgamento do Supremo Tribunal Federal teve um placar apertado, 6 a 5. Significa dizer que, dos onze ministros da mais alta corte brasileira, cinco entendem ser possível, para efeitos civis e previdenciários, a prática da bigamia. Essa ótica jurídica dos ministros vencidos é perigosa e, felizmente, foi derrotada.

Pela visão dos ministros derrotados no julgamento, não existe nenhum tipo de problema (no caso específico, para fins de divisão de pensão por morte junto ao INSS) se uma pessoa possuir, ao mesmo tempo e de forma paralela, dois (ou, quem sabe, até mais…) casamentos ou uniões estáveis. Em outras palavras: a tese vencida tentou legalizar a bigamia, não sendo exagero dizer que faria o mesmo num caso mais extremo, de poligamia.

Até alguns anos atrás era crime, no Brasil, a prática de adultério. Há inúmeros preceitos de cunho religioso e moral que rechaçam a relação afetiva fora do casamento. Vou me restringir às questões jurídicas.

A Constituição Federal dá especial proteção ao casamento. A legislação insere, como um dos requisitos do casamento, o dever de fidelidade recíproca. A infração a este dever, no campo jurídico, não tem nenhuma consequência patrimonial e financeira. Contudo, a mesma legislação brasileira coloca, como um dos casos enumerados que impedem a realização de um casamento, a hipótese de um dos pretendentes já ser casado.

Bem, se a legislação brasileira (e assim é na grande maioria dos países ocidentais) não admite celebrar casamento civil de pessoa que está casada, como poderia o STF querer inovar e permitir a bigamia para efeitos patrimoniais, como no caso de recebimento de pensão do INSS pelo fator morte?

Se uma pessoa é casada (ou tem união estável, o que dá no mesmo juridicamente) com outra, há a expectativa de, quando ocorrer a morte de uma delas, a que permanecer viva terá direitos patrimoniais, inclusive pensão. Já a terceira pessoa, que sabidamente sabe que mantém um relacionamento paralelo e extraconjugal com alguém casado, tem plena ciência de que, em termos jurídicos, aquela situação não gera efeitos patrimoniais positivos para fins previdenciários. Um dos mais consagrados dispositivos legais brasileiros afirma que ninguém pode querer se escusar de cumprir a lei alegando desconhecê-la.

O ministro que deu partida aos votos vencidos, Edson Fachin, assentou que, se a pessoa do caso extraconjugal agiu de boa-fé, teria que ter metade da pensão do INSS. Entretanto, ao contrário da tentativa do ministro de legislar, aqui não se trata de estar ou não imbuído de boa-fé, mas, sim, de já existir lei que claramente dispõe sobre o assunto e rechaça a bigamia.

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *