Há uma frase em latim que diz “Dormientibus Non Socurrit Jus” (o direito não socorre os que dormem). A lei determina prazos, de acordo com cada caso, para que as pessoas obtenham, na prática, o seu direito. Portanto, não basta ter direito a algo, é preciso que tal direito seja pleiteado dentro de um certo tempo. Este limite temporal para se exercer a pretensão a um determinado direito, ou bem da vida, é necessário para garantir a segurança jurídica nas relações sociais.
É pacífico o entendimento dos tribunais brasileiros de que o direito ao reconhecimento da paternidade, que se dá por intermédio da ação denominada investigação de paternidade, é um dos direitos que não encontra limite no tempo, representando uma exceção à regra mencionada.
No entanto, o mesmo não ocorre com respeito a pretensão do suposto filho de pleitear a herança! Assim, mesmo antes de concluída a ação de investigação de paternidade, ou ainda que sequer tenha se iniciado este processo, o suposto filho, ou filha, deve pleitear a herança.
Em julgamento ocorrido em dezembro de 2019, a 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça entendeu que o termo inicial do prazo prescricional para ajuizamento de petição de herança é a abertura da sucessão, o que ocorre com o falecimento do autor da herança. (AREsp 479.648). No mesmo passo decidiu recentemente a 3ª. turma no REsp 1.368.677, ou seja, que o prazo de 10 (dez) anos para o suposto filho pedir a herança começa a correr a partir do evento morte. O STF, quando era competente para julgamento desta matéria, já reconhecia a prescritibilidade da ação de petição de herança, e editou em 1963 a Súmula nº 149: “É imprescritível a ação de investigação de paternidade, mas não o é a de petição de herança”.
Tal entendimento se baseia no art. 1.784 do Código Civil, que diz que aberta a sucessão, o domínio e a posse da herança transmitem-se, desde logo, aos herdeiros legítimos e testamentários, portanto, aquele filho(a), que ainda não obteve uma sentença de reconhecimento, terá direito de ação para buscar sua porção na herança, que ficará reservada até que seja definida a situação a ser apurada na ação de investigação de paternidade. Isso ocorre porque a sentença da ação de investigação de paternidade vem para reconhecer a paternidade que sempre existiu.
Como já afirmado, a prescrição tem por objetivo promover segurança jurídica, estabilidade das relações sociais e paz social. A regra é, pois, a prescritibilidade das pretensões, principalmente as patrimoniais como a petição de herança que objetiva restituição de herança ou parte dela.
Para que o pedido do herança do suposto filho(a) não seja alcançado pela prescrição no curso da ação de investigação de paternidade, este deve cumular o pleito de investigação de paternidade com a petição de herança, para que ocorra a reserva de quinhão hereditário, caso contrário o pedido de herança do suposto filho é alcançado pela prescrição, tendo em vista que o que se almeja é a proteção dos bens referentes à herança até que seja finalizada a discussão sobre a real filiação do peticionário. Portanto, o prazo de 10 anos para petição de herança se inicia mesmo sem a prévia investigação de paternidade ou conclusão desta ação, caso esteja em curso.
Chrisciana Oliveira Mello, sócia de Carlos de Souza Advogados, aluna especial do curso de mestrado em Processo Civil da Universidade Federal do Espírito Santo.
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Artigo publicado pelo Jornal On-line Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/12/12/a-investigacao-da-paternidade-e-o-prazo-para-peticao-de-heranca/