Transação Individual Para Pagamento de Débitos Federais Para Empresas em Recuperação Judicial

Desde abril de 2020, está disponível a transação individual, modalidade de negociação dos débitos federais destinada aos devedores em recuperação judicial ou extrajudicial, falidos, em liquidação judicial ou extrajudicial ou em intervenção extrajudicial. É a mesma modalidade destinada ao débito inscrito em dívida ativa, consolidado, superior a R$ 15.000.000,00 (quinze milhões de reais). Nesse caso, o contribuinte deve enviar para Procuradoria Geral da Fazenda Nacional (PGFN) requerimento eletrônico, instruído por documentos que demonstrem sua capacidade de pagamento, tais como balanço patrimonial, demonstração de resultados acumulados e demonstração do resultado desde o último exercício social. As microempresas e empresas de pequeno porte também podem requerer a transação individual e apresentar livros e escrituração contábil simplificada, nos termos da lei. O requerimento é feito no portal REGULARIZE e acompanhado no ambiente virtual do contribuinte. Inclusive, é possível agendar uma reunião com o Procurador da Fazenda Nacional para discutir os termos do acordo. As condições para pagamento podem ser muito facilitadas, pois há possibilidade de redução de até 70% do débito, sendo vedada a redução do montante principal, bem como o parcelamento em até 145 parcelas, para as microempresas e empresas de pequeno porte, e em até 130 parcelas paras a demais pessoas jurídicas. Apenas os débitos previdenciários têm o limite de parcelas. Com efeito, as empresas em recuperação judicial, que apresentam débitos federais e que desejam buscar, também a regularidade fiscal, podem optar por essa modalidade de negociação dos débitos e aproveitar o ânimo da PGFN em resolver seu passivo, considerando as peculiaridades e capacidade de pagamento dos devedores. Essa abertura na comunicação com o contribuinte beneficia a continuidade das atividades das empresas e evita a criação de novas demandas judiciais. Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/13/transacao-individual-para-pagamento-de-debitos-federais-para-empresas-em-recuperacao-judicial/

O Paciente Tem Direito ao Retorno de Consulta Médica Sem a Necessidade de Novo Pagamento?

A resposta é depende! Muitos têm a impressão de que toda e qualquer consulta eletiva realizada em consultório médico confere ao paciente o direito de retorno, sem ônus, pelo prazo de 30 dias. Mas a verdade não é bem essa! O Conselho Federal de Medicina (CFM) regulamentou, através da Resolução nº 1.958, de 15 de Dezembro de 2010, o ato da consulta médica, a possibilidade de sua complementação e reconheceu ser do médico assistente a identificação das hipóteses em que poderá haver ou não a cobrança de novos honorários. De início a Resolução nº 1.958 do CFM já traz em seu artigo 1º a clara definição de consulta médica como sendo o ato que “compreende a anamnese, o exame físico e a elaboração de hipóteses ou conclusões diagnósticas, solicitação de exames complementares, quando necessários, e prescrição terapêutica como ato médico completo e que pode ser concluído ou não em um único momento”. Já nos parágrafos seguintes há o esboço das hipóteses em que poderá haver ou não a cobrança de nova remuneração pelo profissional. Dispõe o legislador que havendo necessidade de realização de exames complementares que não possam ser analisados na mesma consulta, o ato terá sua continuação em momento posterior em tempo determinado a critério do médico, não gerando cobrança de honorário. Veja que o texto da Resolução do CFM não institui um prazo máximo (como muitos acreditam ser de 30 dias) para que o retorno sem ônus ao paciente ocorra, competindo ao profissional a sinalização dentro de suas possibilidades para atendimento. Merece destaque o fato de que a Resolução menciona que o retorno não oneroso é tão somente para verificação de exames solicitados. Descreve ainda que mesmo dentro da hipótese acima (apreciação de exames), existe a possibilidade do atendimento de distinta doença no mesmo paciente, o que caracteriza novo ato profissional passível de cobrança de novos honorários médicos. A Resolução diz ainda que no caso de alteração de sintomas/sinais que requeiram nova anamnese, exame físico, hipótese ou conclusão diagnóstica e prescrição de tratamento, o procedimento deverá ser considerado como nova consulta e dessa forma deve ser cobrada/remunerada. De igual forma ocorre com a hipótese de doenças que requeiram tratamentos prolongados com reavaliações e até modificações terapêuticas, consultas estas que podem ser ou não cobradas a critério do médico assistente. Importante destacar que a Resolução confere ao médico assistente, e apenas a ele, a identificação das hipóteses de nova cobrança ou não por retorno, quando do atendimento, vedando a terceiros o estabelecimento de prazos específicos que interfiram na autonomia do médico e na relação deste com o paciente, nem estabelecer prazo de intervalo entre consultas. Rovena Roberta S. Locatelli Dias, sócia de Carlos de Souza Advogados, especializada em Direito Civil, Médico, Comercial e Imobiliário. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/12/o-paciente-tem-direito-ao-retorno-de-consulta-medica-sem-a-necessidade-de-novo-pagamento-2/

O Que Significa a Restituição de Bem na Falência?

Hoje, o nosso texto versará sobre assunto que reputamos deter grande importância nos campos prático e jurídico, que é a restituição de bem na falência. Essa restituição atua para evitar prejuízo patrimonial daquele que acabou se envolvendo no processo falimentar, embora com este nada tenha a ver. Ficou curioso (a) para saber o que significa este instituto? Pois então vamos a ele. Um dos efeitos imediatos da falência é o falido perder a função, o direito de administrar seus bens ou deles dispor. Essa função é transmitida ao administrador judicial nomeado pelo juiz no processo falimentar, que efetuará a arrecadação de todos os bens encontrados no (s) estabelecimento (s), ficando de fora os impenhoráveis. Esse ato de arrecadação é o ponto de partida para futura realização do ativo, que se traduz na transformação dos bens arrecadados em dinheiro, por intermédio de processos de alienação especificados na Lei nº 11.101/2005, com o desiderato de pagamento aos credores. Mas, nem sempre esse ato arrecadatório envolve apenas os bens de propriedade do próprio falido. Não raro, os bens arrecadados, por exemplo, são fruto de transações locatícias que haviam sido firmadas com o agora falido, sendo ele o locador, ou advêm de relação de comodato, sendo ele o comodatário (que recebeu o bem por empréstimo), e/ou, ainda, é possível que o falido esteja na posse do bem como simples depositário, isto é, em quaisquer destas hipóteses ele não exerce a propriedade do bem. Como não poderia ser diferente, o legislador exclui do patrimônio do devedor falido os bens, sentido lato, que não sejam de sua propriedade. Neste caso, o real proprietário poderá pedir a devolução ao juiz da falência, calcado nas provas necessárias à demonstração da sua propriedade. Se o pedido for aceito, o juiz sentenciará a devolução, porém, se o bem ao tempo desse pedido não mais existir, devolve-se a quantia apurada em avaliação, ou no caso de ter ocorrido sua venda, o respectivo preço, sendo que em ambos os casos o valor pago é sempre atualizado. Portanto, o instituto objeto deste artigo, pode-se dizer, significa o legítimo direito de um terceiro reivindicar a propriedade de algo que lhe pertença, mas que foi atingido pela falência do devedor, o que em última análise permite a lapidação do patrimônio legítimo dele à execução coletiva dos seus credores. Raphael Wilson Loureiro Stein é Associado do Escritório desde abril de 2019 e atua nas áreas: Contencioso Civil, Comercial e Recuperação de Empresas e Falência. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/11/o-que-significa-a-restituicao-de-bem-na-falencia-2/

Defeito no Produto Identificado Após o Fim da Garantia Obriga o Fornecedor a Repará-lo?

É muito comum que o consumidor, no ato da compra de um produto, seja informado acerca do período de garantia, alusivo ao prazo que lhe garante o reparo ou o ressarcimento do valor pago pelo produto, caso seja identificado defeito. O que poucos consumidores sabem, entretanto, é que existem pelo menos três tipos de garantia, e que, em determinados casos, o consumidor pode ser reparado por vícios identificados mesmo após o fim do período da garantia oferecida pelo fornecedor. A primeira modalidade de garantia é a legal, estabelecida pelo próprio Código de Defesa do Consumidor, e independe de previsão contratual, autorização do fornecedor ou modalidade do produto. De acordo com o artigo 18 do CDC, o consumidor tem 30 dias para reclamar de problemas com o produto se ele não for durável, e 90 dias em caso de produtos duráveis (eletrodomésticos, por exemplo). A segunda modalidade de garantia é a contratual, que é fornecida pelo fabricante do produto, geralmente mediante contrato ou termo, através da qual, por liberalidade, o fabricante agrega mais tempo de garantia. O termo inicial é a data da emissão da nota fiscal e estende-se por geralmente 12 meses. Nesses casos, o CDC determina que a garantia contratual soma-se à legal, complementando-a. Geralmente não há valor cobrado pelo fornecedor para esta modalidade de garantia. A terceira modalidade de garantia é a estendida, comumente oferecida pelo fornecedor mediante pagamento de uma taxa adicional, destinada a uma empresa terceirizada que funciona como um “seguro”, que poderá ser acionado caso haja algum problema com o produto dentro do período contratado. Mas o que fazer caso o problema seja identificado após o período de garantia contratado junto ao fornecedor? O consumidor pode acioná-lo e reivindicar o ressarcimento do valor pago pelo produto ou mesmo o reparo? O que poucos sabem, é que o Código de Defesa do Consumidor impõe ao fornecedor a obrigação de responder por defeitos de fabricação até mesmo após o fim do período de garantia legal e contratual, quando se tratar dos vícios ocultos, quais sejam, os defeitos que não são facilmente identificados, podendo demorar até mesmo anos para virem à tona. Com relação a esta modalidade de vício, o CDC estabelece que o consumidor tem direito à reparação até o final da vida útil do produto, e o prazo para reclamação começa a contar a partir do momento em que o defeito for identificado. Assim, ainda que o fornecedor não entregue esta informação, esteja atento, uma vez que ainda é possível buscar por reparação caso o vício oculto se apresente, mesmo após anos de uso do produto. Mayara Ferraz Loyola Rufino é associada de Carlos de Souza Advogados e atua na área Contencioso Cível. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/09/defeito-no-produto-identificado-apos-o-fim-da-garantia-obriga-o-fornecedor-a-repara-lo-2/

Turma do TST Reconhece Vínculo de Emprego de Motorista de Aplicativo (Uber)

O TST, em recente decisão colegiada no processo nº RR-100353-02.2017.5.01.0066, entendeu pela existência de vínculo de emprego de um motorista de Uber. Certamente, vale realizar considerações sobre este caso especificamente dado o impacto e repercussão que referida decisão pode causar até mesmo para os usuários do serviço em todo o país. Pois bem. Para a maioria do colegiado, entendeu-se que na relação provada no processo, estariam presentes os requisitos legais determinantes para o reconhecimento de vínculo de emprego, previsto no artigo 3º da CLT, a saber: onerosidade, habitualidade, prestação de trabalho por pessoa física a outrem com pessoalidade e subordinação. Nesses termos, entendeu a corte superior que a relação de emprego estaria caracterizada porque o autor do processo teria laborado com subordinação, pois há monitoramento tecnológico constante, ainda que seja diferente a subordinação das situações trabalhistas ordinárias. Quanto à pessoalidade, teria ficado provado que o autor, pessoa física, precisou se inscrever na plataforma, com apresentação de seus dados, sendo submetido a um sistema de avaliação individual por meio das notas atribuídas pelos clientes. Com relação à habitualidade, foi demonstrado que o autor do processo teria trabalhado todos os dias, com controle da empresa do seu tempo à disposição. Sobre a onerosidade, foi consignado que ocorre o repasse para a empresa, em torno de 20% ou 25% das viagens pagas pelos clientes, à plataforma, ficando o motorista com o maior valor da viagem, o que seria justificado pelos custos existentes de manutenção do veículo, combustível e outras despesas associadas à prestação do serviço. É certo que este tipo de prestação de serviço de motorista por aplicativo configura um novo modelo de relação de trabalho, que ainda não se encontra normatizada, envolvendo cerca de um milhão de profissionais no Brasil. A empresa, por sua vez, se posiciona no sentido de que os motoristas não são seus empregados e nem prestam serviços a ela, sendo aqueles apenas pessoas físicas que contratam o serviço tecnológico da empresa via aplicativo, para prestarem um serviço, sendo que a maioria das decisões tem sido no sentido de inexistir vínculo de emprego. Ainda reforçam que o empregado escolhe livremente suas viagens, horários, dias e ainda podem cancelar determinada viagem, não havendo imposição de jornada de trabalho. Alegam ainda não existir metas a serem cumpridas, como, por exemplo, número mínimo de viagens, não existe chefia com supervisão do serviço, não há obrigação de exclusividade na contratação da empresa. De um modo geral e diante desses entendimentos judiciais de existência e não existência de vínculo empregatício na relação corrida, necessário aguardar uma uniformização até mesmo no TST sobre o assunto e até mesmo a normatização do motorista de aplicativo. Rodrigo Silva Mello e Roberta Conti R. Caliman, sócios de Carlos de Souza Advogados, são especializados em Direito Trabalhista. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/06/turma-do-tst-reconhece-vinculo-de-emprego-de-motorista-de-aplicativo-uber/

Indulto, Graça e Anistia – Principais Aspectos

O Estado trouxe para si o monopólio de punir, entretanto, conforme previsto no artigo 107 do Código Penal, haverá, dentre várias hipóteses, a extinção de punibilidade do agente por três institutos, quais sejam, anistia, graça ou indulto, conhecidas como clemência soberana, que são formas de renúncia estatal ao seu direito de punir, contudo, em diferentes situações e momentos. Com relação à anistia, se resume em uma forma de o Estado renunciar ao seu poder punitivo através do Congresso Nacional (artigo 48, VIII, Constituição Federal), por meio de uma Lei sancionada pelo Presidente da República que “perdoa”, não a pessoa, mas sim aquele fato criminoso, extinguindo os efeitos penais do crime (ex tunc – retroage apagando os efeitos criminais). Logo, entende-se que na hipótese do acontecimento de novo crime pelo mesmo agente outrora anistiado, não será considerado reincidente. Ademais, como já dito, a anistia não recai sobre a Lei, ou seja, o fato continua sendo configurado crime. O que ocorre é que aquele fato criminoso em específico é “esquecido”, por razões, em sua maioria, políticas, sociais ou econômicas. Quanto ao alcance, o instituto da anistia não engloba os crimes hediondos, o tráfico ilícito de entorpecentes, o terrorismo e a tortura, conforme artigo 5º, XLIII, da Constituição Federal, e artigo 2º, I, da Lei nº 8.075/90. Com relação ao tempo de aplicação, pode ser concedida antes ou depois do trânsito em julgado da sentença condenatória, podendo beneficiar todos ou alguns dos agentes, visto ser necessário, a depender de cada situação, o cumprimento de alguns requisitos pessoais ligado ao indivíduo separadamente. Já com relação aos institutos de indulto e graça, o direito brasileiro não estabelece uma fácil distinção dos respectivos, entretanto, ambos são tratados pelo Presidente da República, sendo esse o competente para tanto, porém, podendo ser delegado ao Procurador Geral da República, o Advogado Geral da União, Ministros de Estado ou concedidos por meio de um Decreto. O indulto, também chamado de indulto coletivo, visto ser um benefício coletivo, está previsto no artigo 84, XII, da Constituição Federal, e se destina aos sentenciados que cumprem uma pena privativa de liberdade. Além disso, se faz necessário que se enquadrem nas hipóteses previstas no Decreto. No indulto, pressupõe condenação e só extingue ou comuta a pena, mas não apaga qualquer outro efeito penal ou extrapenal da condenação, ou seja, se vier a cometer outro crime, considerar-se-á reincidente. Ademais, o indulto é um benéfico, em sua maioria, de abrangência coletiva, ou seja, não tendo um destinatário certo/individual, não necessitando, em regra, de qualquer provocação, somente sendo necessário que o Presidente da República se manifeste no aludido sentido. Logo, pode ser concedido de ofício. Como exemplo, cita-se o indulto de natal, tendo este, regras específicas que poderão ser ditas em outra oportunidade. Em contraponto, a graça é um benefício individual, atualmente sendo chamado por muitos de indulto individual, ou seja, tem destinatário individualizado/certo, além de ser possível o deferimento somente após provocação. A graça e o indulto não poderão receber aplicação caso o crime tenha sido tortura, tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, terrorismo e os definidos como crimes hediondos. Samuel Lourenço Kao Yien, associado de Carlos de Souza Advogados, atua na área de Direito Criminal. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/04/indulto-graca-e-anistia-principais-aspectos/

Crime de Omissão de Socorro

O tipo penal de omissão de socorro é um dos mais claros exemplos da lógica que está por trás da convivência em sociedade. Numa sociedade, uns precisam cuidar dos outros. Essa é a mecânica que dá sentido à existência de tribos, comunidades e cidades. Se não fosse essa ideia de cuidado mútuo que caminhou para sociedade e Estado, cada um poderia viver por si próprio da forma que bem entendesse. Não é por outra razão que temos leis, direitos e deveres. Numa sociedade organizada e estado democrático de direito, como o Brasil é, a não observância de uma norma gera penalidades. Da mesma forma, mesmo que não tenha a devida consciência disto, todos cuidam uns dos outros, sem exceção. Como assim? Vamos a um exemplo: o pagamento de impostos. Uma compra é feita num supermercado; sobre o valor pago um imposto é recolhido; aquele imposto vai cuidar da saúde, educação e segurança de outras pessoas indeterminadas. Podemos até não saber de quem estamos cuidando indiretamente, mas o cuidado mútuo está presente um tudo na sociedade. É exatamente a reciprocidade assistencial que justifica a existência do crime de omissão de socorro, previsto no artigo 135 do Código Penal: deixar de prestar assistência, quando possível fazê-lo sem risco pessoal, à criança abandonada ou extraviada, ou à pessoa inválida ou ferida, ao desamparo ou em grave e iminente perigo; ou não pedir, nesses casos, o socorro da autoridade pública. É claríssima a norma legal ao obrigar a prestação de socorro ou, no mínimo, pedir o socorro a uma autoridade pública, seja o SAMU ou a polícia. Felizmente o brasileiro em sua grande maioria é solidário e dado a socorrer o próximo, mas lamentavelmente há exceções. Pior do que a omissão de socorro em si é quando ela é praticada por um profissional que existe exatamente para atender à necessidade que a pessoa apresenta naquele exato momento, como o caso de recusa ou retardamento inaceitável de prestar atendimento em ambiente hospitalar. Não importa se o hospital é público ou privado. Quando alguém bate à porta em uma situação de aparente emergência de saúde, precisará ser prontamente atendido, mais ainda se o paciente chegar de ambulância e os paramédicos relatarem situação que não pode estar sujeita a esperar acima do que o necessário para levar o paciente à presença de um médico. Apesar de a pena criminal ser baixa e não levar ninguém à cadeia, já que não passa de seis meses e pode chegar no máximo a dez meses se causar a morte, as sanções pela omissão de socorro podem invadir a esfera civil e gerar o direito a indenizações por danos materiais e morais, entre outros. Um julgamento do Tribunal de Minas Gerais ilustra circunstâncias e penalidades de omissão de socorro: “Se a prova dos autos nos dá conta de demora no atendimento médico, em quadro que indicava gravidade, vindo o marido da vítima a falecer, não há dúvida alguma da responsabilidade do Município pelos danos materiais e morais experimentados pela requerente, inexistindo hipótese de afastamento, ou causas de justificação”. Importante pontuar que não basta haver a aparente omissão de socorro como causa de dano físico parcial e morte, quando esta acontecer. É preciso que a vítima ou sua família prove que a recusa ou demora no atendimento tenha causado o resultado maléfico. Essa prova pode ser feita por diversas formas, incluindo o depoimento de pessoas que tiverem presenciado o ocorrido, especialmente paramédicos da ambulância, quando for o caso, mas sem dúvidas uma prova pericial realizada por um médico designado pela Justiça será fundamental para estabelecer a conexão entre o mal atendimento e a tragédia. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/03/crime-de-omissao-de-socorro/

Novas Regras do Inventário Extrajudicial Simplificam e Otimizam Procedimentos Anteriores à Partilha

Muitas famílias se deparam com o triste evento do falecimento de um ente querido sem que haja um conhecimento mínimo de suas reais condições financeiras, sejam seus bens (ativos) ou suas dívidas (passivo). Isto porque no Brasil há regra prevendo o sigilo fiscal e algumas pessoas não compartilham informações sobre seus bens ou valores que dispõem nem mesmo com parentes muito próximos. No entanto, a lei prevê um curtíssimo espaço de tempo, de apenas 60 dias, para a abertura do inventário, sob pena de multa. Mas o que fazer diante do desconhecimento total, ou apenas parcial, quanto ao espólio, ou seja, sobre os bens, direitos e obrigações do falecido? Quem será a pessoa apta para passar a representar este espólio, conhecido como inventariante, e que poderia reunir essas informações? Registre-se que de acordo com o art. 617 do Código de Processo Civil, há uma ordem estipulada para nomeação do inventariante – pessoa que representa o espólio do falecido inclusive perante órgãos da administração pública -, que prevê primeiramente o cônjuge ou companheiro sobrevivente; em sua falta o herdeiro que se achar na posse e na administração do espólio, seguindo-se por exclusão qualquer herdeiro, o herdeiro menor, por seu representante legal; o testamenteiro, se lhe tiver sido confiada a administração do espólio ou se toda a herança estiver distribuída em legados; o cessionário do herdeiro ou do legatário; e pessoa estranha idônea, quando não houver inventariante judicial. Ocorre que no dia 28 de abril, quinta-feira, o Conselho Nacional de Justiça – CNJ publicou a Resolução 452 que trouxe importante alteração sobre a nomeação de inventariante na escritura pública de inventário e partilha, sem necessidade de seguir a ordem prevista no art. 617 do Código de Processo Civil,  acrescentando o seguinte: o meeiro – viúvo(a) ou companheiro(a) conforme o regime de bens – e os herdeiros poderão, em escritura pública anterior à partilha ou à adjudicação, nomear inventariante. Esse inventariante poderá representar o espólio na busca de informações bancárias e fiscais necessárias à conclusão de negócios essenciais para a realização do inventário e no levantamento de quantias para pagamento do imposto devido e dos emolumentos do inventário. Importante notar que a nomeação de inventariante será considerada o termo inicial do procedimento de inventário extrajudicial, ou seja, para todos os fins de direito, com a nomeação do inventariante considera-se iniciado o procedimento de inventário. Esta alternativa trazida pelo CNJ simplifica sobremaneira a situação do cônjuge ou companheiro sobrevivente e dos herdeiros, posto que de posse da escritura de nomeação de inventariante, obtida de maneira extrajudicial, é possível reunir todas as informações do espólio, apurar a existência de bens, contas correntes, aplicações, ou seja, obter dados e até mesmo pagar impostos, essenciais para que se efetive o inventário e a partilha de bens. Note-se ainda ser de suma importância que para este procedimento extrajudicial de nomeação de inventariante a pessoa que será nomeada, e naturalmente os demais herdeiros, constituam advogado que auxiliará em todo o processo, mesmo que de maneira extrajudicial, pois além de ser essencial ao ato poderá orientar e traçar os passos que se seguirão à nomeação e, ao final de toda a jornada, concluir o inventário. Chrisciana Oliveira Mello, sócia de Carlos de Souza Advogados, aluna especial do curso de mestrado em Processo Civil da Universidade Federal do Espírito Santo. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/05/02/novas-regras-do-inventario-extrajudicial-simplificam-e-otimizam-procedimentos-anteriores-a-partilha/