O Dano Moral Trabalhista nas Recuperações Judiciais e Falências

De partida, cumpre anotar que as verbas trabalhistas são primeiramente apuradas na Justiça do Trabalho, para que depois sejam levadas aos processos de recuperação judicial, se esta estiver em curso, ou à falência, se ela tiver sido decretada, e são valores que têm preferência de pagamento em relação a outros créditos, como por exemplo os quirografários, que são aqueles que decorrem de uma simples relação contratual sem qualquer tipo de garantia. No Direito brasileiro a verba trabalhista tem prevalência a outros créditos, por ser entendida como elemento de primeira necessidade do ser humano, não podendo ficar posicionada no final de uma fila concorrendo com vários outros tipos de créditos de menor importância. O Superior Tribunal de Justiça (STJ), que tem a função de pacificar a interpretação das leis federais brasileiras, entendeu que, dependendo do caso concreto, também a indenização por dano moral devida ao empregado poderá ter natureza trabalhista, a fim de que possa gozar dos respectivos privilégios, dentre os quais o pagamento antecipado nas recuperações judiciais e falências. Na decisão representada pelo Recurso Especial de nº 1869964, explicou-se que embora a indenização por dano moral passe primeiro pela esfera de direito civil para se apurar a responsabilidade e chegar à condenação propriamente dita, a sua natureza será de verba trabalhista sempre que o ato ilícito que deu ensejo ao dano ocorrer durante o desempenho das atividades laborais do empregado, sem prejuízo de um processo justo com direito de defesa e contraditório às partes litigantes. Para finalizar, é de se observar, no ponto, que o legislador trabalhista diz que a totalidade dos salários devidos aos empregados e a totalidades das indenizações a que tiverem direito constituem créditos com o mesmo privilégio, o que facilita o raciocínio de que aí se insere, também, o dano moral trabalhista, que deverá ser pago antecipadamente nas recuperações e nas falências. Raphael Wilson Loureiro Stein é Associado do Escritório desde abril de 2019 e atua nas áreas: Contencioso Civil, Comercial e Recuperação de Empresas e Falência. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/20/o-dano-moral-trabalhista-nas-recuperacoes-judiciais-e-falencias-2/

Lavagem de Dinheiro nas Pirâmides Financeiras

A lavagem de dinheiro, em tese, pode ser interpretada se ficar caracterizada a pirâmide financeira. Alguém é processado porque, através de uma empresa que aparentava ser legítima, ficou demonstrado que na verdade se tratava de uma pirâmide financeira. Sendo pirâmide financeira, todo o dinheiro movimentado seria ilícito e, portanto, sua movimentação, sujeita ao crime de lavagem de dinheiro. Entendo que isso não pode ser generalizado. Cada caso deve ser tratado de forma isolada. O que temos visto são delegados e membros do Ministério Público que, ao acusar alguém de prática de pirâmide financeira, já incluem automaticamente o crime de lavagem de dinheiro. Pirâmide financeira é algo reprovável e nocivo, devendo ser combatido. Contudo, ser ou se tornar uma pirâmide financeira não implica, necessariamente, crime de lavagem de dinheiro. Mesmo que se caracterize a prática de pirâmide financeira, não há como de pronto falar que houve lavagem de dinheiro, prática que pressupõe uma clara infração penal, um crime explícito, que não pode se confundir com a quebra do negócio ou algum outro tipo de crime. Vejamos o que diz a Lei no 9.613, de 1998, ao tipificar o crime de lavagem de dinheiro: Art. 1º – Ocultar ou dissimular a natureza, origem, localização, disposição, movimentação ou propriedade de bens, direitos ou valores provenientes, direta ou indiretamente, de infração penal. Pena – reclusão, de 3 (três) a 10 (dez) anos, e multa. A lavagem de dinheiro, também chamada lavagem de capital ou branqueamento de capitais, pode ser explicada vulgarmente (e de modo reducionista) como o processo de mutação do dinheiro sujo (produto criminoso) em dinheiro limpo (aparentemente regular). Trata-se, em verdade, da manobra delitiva de introdução no sistema econômico e financeiro oficial dos produtos auferidos com práticas criminosas (anteriores). É inegável, portanto, que o delito de lavagem de dinheiro possui natureza acessória, derivada ou dependente, mediante relação de conexão instrumental e típica com ilícito penal anteriormente cometido (do qual decorreu a obtenção de vantagem financeira, em sentido amplo, ilegal). Com o advento da Lei n. 12.683, de 2012, não há mais restrição quanto ao rol (antes taxativo) de crimes precedentes e necessários à discussão sobre a lavagem de capital. Em verdade, não há sequer rol de crimes antecedentes. A nova legislação sobre o tema alargou por completo o âmbito de reconhecimento da lavagem, que poderá ocorrer (em tese) diante de qualquer infração penal. Volto agora ao ponto inicial deste tópico: o crime de lavagem de dinheiro exige ocultação ou dissimulação de bens. Ou seja, ao contrário do que autoridades mal informadas podem tentar impor, não basta apenas a infração penal. Não é suficiente a empresa ser caracterizada como uma pirâmide financeira. É preciso haver a ocultação ou dissimulação de valores ou bens diversos que tenham advindo da operação supostamente criminosa. Ocultação: ação ou efeito de ocultar; ação ou resultado de encobrir ou esconder. Dissimulação: atitude daquele que dissimula, finge, disfarça suas reais intenções ou propósitos. Tendo a empresa contrato social, CNPJ, sede e conta bancária e operando à luz do dia, inclusive com eventos e publicidade, onde está a ocultação? Todo negócio tem riscos, e os empreendedores podem responder pelos prejuízos até com o patrimônio pessoal, conforme o caso. Mas atribuir deliberadamente os infortúnios empresariais de uma pirâmide financeira ao crime de lavagem de dinheiro está longe de ser uma atitude justa e legal. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/19/lavagem-de-dinheiro-nas-piramides-financeiras/

Agronegócio e Tributação

Em 2021, o setor de agronegócio teve participação em 27,4% do PIB brasileiro, segundo o CEPEA – Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada da ESALQ – Escola Superior de Agricultura Luiz de Queiroz, USP – Universidade de São Paulo. Portanto, é notória a importância do setor para a economia brasileira. No cenário mundial, o papel do agronegócio brasileiro ocupa posição cada vez mais estratégica, principalmente, em virtude da perda da capacidade de produção e abastecimento de alimentos e insumos por parte de alguns países, com o avanço da crise e dos conflitos. Além da proteção dada pela Constituição Federal, o segmento dispõe de alternativas legais para redução da carga tributária. Por exemplo, a possibilidade utilização de apuração de créditos de PIS e COFINS sobre insumos da produção agrícola. Nesse caso, a depender da atividade, podem ser considerados insumos os serviços de análise de calcário e fertilizantes, serviços de carregamento, análise de solo, adubos, transporte de barro, argila, sementes, equipamentos, materiais agrícolas, de mudas, serviços de manutenção em ferramentas e máquinas, além da aquisição de graxas e materiais de limpeza de equipamentos e máquinas.  Portanto,  os produtos e serviços relevantes e essenciais, imprescindíveis para a atividade agrícola poderão ser considerados insumos e gerar créditos de PIS e COFINS. Esse entendimento está de acordo com a definição dada pelo Superior Tribunal de Justiça (STJ), no sentido de que insumo são bens ou serviços relevantes ou essenciais à produção, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância para a atividade econômica. Outra possibilidade de economia tributária para o agronegócio está relacionada ao direito de dedução do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição sobre o Lucro Líquido (CSLL) as despesas com aquisição de ativos naturais que se esgotam na exploração da atividade, conhecida como depreciação acelerada incentivada. Os custos com a aquisição podem ser deduzidos no próprio ano da aquisição do bem, o que acaba por reduzir o lucro que será tributado de forma imediata. A análise das possibilidades de economia tributária se dá à luz da legislação vigente e do entendimento atual dos órgãos administrativos responsáveis pelo julgamento de processos administrativos fiscais, além do Poder Judiciário. É necessário conhecer o negócio e aplicar a legislação de forma adequada, para que as melhores oportunidades sejam aproveitadas pelo contribuinte. Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/15/agronegocio-e-tributacao/

Garantia Social do Trabalhador Portador de Deficiência e a Manutenção no Emprego

Em março de 2022 foi publicada decisão pelo Tribunal Superior do Trabalho – TST (6ª Turma), que invalidou a dispensa ocorrida de um empregado deficiente auditivo, processo nº 1000912-17.2016.5.02.0073. Inicialmente, para entender melhor a questão da dispensa de empregado portador de deficiência, esclarece-se que a Lei nº 8.213/91, em seu artigo 93, define e torna obrigatória a contratação de empregados reabilitados (os que retornam do INSS após afastamento, mas ainda estão em recuperação) ou pessoas com deficiência. No mesmo artigo, constam os percentuais de quantos empregados nesta situação devem fazer parte dos quadros da empresa. O parágrafo 1º desse mesmo artigo diz que a dispensa do empregado portador de necessidade especial somente poderá acontecer desde que ocorra contratação de substituto de condição semelhante. Veja que a lei não mencionou a existência de estabilidade ao empregado em condições especiais que foi demitido. Ou seja, a lei não falou que seria nula a demissão, mas apenas ressaltou que a cota (número mínimo de empregados portadores de deficiência contratados) deve ser observada para fins demissionais. Essa, inclusive, foi a tese defensiva da empresa, quando disse que a lei não cria direito de estabilidade, se limitando em estipular uma obrigação para a empresa e por isso não haveria nulidade na demissão. Referida tese patronal foi aceita no TRT da 2ª Região, ressaltando ainda a inexistência de previsão de reintegração ou pagamento de indenização e que o legislador, no artigo 93 de referida lei, buscou assegurar manutenção de postos de trabalho dos portadores de necessidades especiais, de modo que seu descumprimento não assegura, ao dispensado, referida reintegração, nem pagamento dos salários e verbas contratuais do período; no máximo, caberia uma autuação pela fiscalização do trabalho. Entretanto, o trabalhador recorreu ao TST que proferiu decisão filiando-se ao seu entendimento já consolidado, no sentido de que a validade da dispensa de empregado reabilitado ou com deficiência está condicionada à comprovação de contratação prévia de substituto nas mesmas condições e a empresa, em referido processo, não comprovou tal contratação. O TST fundamenta sua decisão, analisando o artigo 93 citado acima juntamente com os princípios constitucionais, ou seja, não realizou uma avaliação isolada da norma. Para o TST, o legislador objetivou manter o percentual de vagas para portadores de deficiência e profissionais reabilitados, por uma questão social de um grupo de pessoas que demandam uma assistência especial e não individual, colocando como condição à dispensa do empregado com deficiência, a contratação de outro em mesmas condições, sendo medida de justiça reconhecer a reintegração. Além disso ponderaram a previsão do artigo 7º, XXXI da CF/88 que proíbe discriminação ao portador de deficiência. Sendo assim, cabe às empresas se atentarem à observância do cumprimento da cota de deficientes ao procederem com uma demissão de empregado em tais condições, sob o risco de terem a rescisão anulada com o pagamento de indenizações, sejam elas de salários vencidos e que vencerão bem como por danos morais, a depender da situação. Rodrigo Silva Mello e Roberta Conti R. Caliman, sócios de Carlos de Souza Advogados, são especializados em Direito Trabalhista. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/14/garantia-social-do-trabalhador-portador-de-deficiencia-e-a-manutencao-no-emprego/

Herança Digital

Herança digital é o conjunto de bens ou direitos utilizados, publicados ou guardados em plataformas ou servidores virtuais, sejam elas acessadas de forma online ou não e podem consistir em contas em diferentes canais, materiais de mídias virtuais (como textos, áudios ou vídeos) e senhas de acesso a serviços online e redes sociais, por exemplo. O patrimônio digital pode ser composto por bens que têm ou não valor financeiro. Isso significa que pode consistir em um conjunto de itens com valor apenas simbólico ou subjetivo, como páginas ou publicações nas redes sociais, contas de e-mails, interações com outras pessoas, produções criativas, entre outras. Apesar de não haver legislação específica sobre a herança digital, ela traz efeitos no mundo jurídico uma vez que, é fato, as pessoas do mundo moderno não mais se individualizam e se identificam apenas por sua assinatura de próprio punho, mas, sim, pelos seus tokens, chaves, logins e senhas, certificações digitais e reconhecimentos faciais. Em que pese a ausência de legislação específica no Brasil, diversas plataformas já se anteciparam e permitem ao usuário formalizar um “testamento digital”, ocasião em que pode escolher, em vida, quais bens digitais e a quem estes serão direcionados após a morte. Entretanto, para respeitar a privacidade e intimidade do falecido, algumas redes sociais não permitem que a pessoa selecionada possa ver as mensagens privadas ou realizar novas postagens na conta em nome do falecido, sendo possível a exclusão total da conta ou alteração do nome e foto do perfil, assim como gerenciar solicitações de contatos. Alguns bens digitais, por serem dotados de valor nitidamente econômico, enquadram-se perfeitamente ao conceito de patrimônio para fins de composição do espólio e posterior partilha, como por exemplo: cifras de dinheiro real, como o PayPal; carteiras de moedas digitais; contas em redes sociais que sejam monetizadas ou potencialmente monetizáveis; mídias pagas ou que possam ser vendidas; domínios; arquivos de documentos em nuvem. Há, por outro lado, bens digitais sem valor econômico: contas comuns nas redes sociais; posts; senhas de e-mails e outros aplicativos; fotos, vídeos e documentos sem valor financeiro apreciáveis, armazenados em nuvem. Quanto aos bens digitais com valoração econômica, podem compor o conjunto de bens para fins de partilha entre os herdeiros do falecido, sendo possível a um juiz autorizar o acesso à herança digital através de redifinição de senhas. Já com relação aos bens simbólicos, a corrente majoritária entende que, despidos de qualquer apreciação econômica, dizem respeito à esfera privada do falecido. Dessa forma, como os herdeiros sucedem os bens e não a pessoa do falecido, esse acervo deve ser extinto com a morte do proprietário, não havendo repasse a terceiros. Visando evitar litígios entre os herdeiros, aconselha-se que a pessoa, havendo bens digitais com importante valor econômico, disponha em testamento a respeito do acesso por parte dos herdeiros. O testamento é a forma mais segura de garantir a destinação almejada aos bens digitais. Isso porque a ausência de regulação a respeito do tema torna incerto o desígnio desse acervo, que pode ir de encontro à vontade do falecido. É necessário ter em mente que mesmo que uma pessoa não disponha em seu testamento acerca de suas senhas e bens virtuais, ainda é possível que os herdeiros requeiram e obtenham acesso a eles perante o Judiciário. Ainda vale ressaltar que mesmo os bens que possuam valor meramente afetivo ou sentimental, não deixam de representar um patrimônio que deve receber um destino, podendo, portanto, ser incluídos para fins de disposição testamentária. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/13/heranca-digital-2/

Líderes Respondem Por Dívidas de Empresa de Multinível?

Minha opinião é clara e direta: via de regra, os líderes não respondem por dívidas da empresa, nem perante a rede e muito menos com consumidores. Quem, de fato, é considerando um líder num negócio que utiliza o marketing multinível? A resposta não é simples, uma vez que, na prática, não existe uma relação jurídica formal que credencie alguém a ser chamado de líder num negócio com estratégia de marketing de rede. O que temos visto, ao longo de anos de experiência, são pessoas que, em grande parte trabalhando para diversas marcas na sua carreira, acabam se destacando no mercado como aglutinadores de equipes capacitadas, comprometidas e motivadas. Essas pessoas tanto sabem vender o produto ou serviço que compõe o respectivo negócio, como conseguem formar os melhores times que fazem as vendas acontecerem de forma sustentável e crescente. Esse é o líder num negócio que usa o multinível como força comercial. Mesmo não tendo um título formal de líder, ele desbrava campos, abre mercados e tem grande contribuição no crescimento do negócio. O líder não é sócio ou empregado da empresa. Ele é um empreendedor independente que traz grandes resultados e é recompensado por isto, tanto com ganhos diretos (vendas feitas por ele), como com ganhos indiretos (participação nas vendas feitas por sua rede). Fora os bônus extras, premiações e outros mimos que a empresa dá a quem lhe traz resultados diferenciados. O mercado de usa muito títulos: líderes, presidente, rubi, diamante, ouro e coisas similares. Nada de errado em adotar essas referências. Mas elas são somente isto: referências. Representam conquistas que os melhores marqueteiros alcançaram, com base em seus esforços pessoais e muito trabalho. Não são cargos. Essas pessoas não possuem poder de gestão na empresa. Claro que ganham muito mais do que a maioria dos componentes da rede; como eu disse, recebem mais em dinheiro, comissões, bônus, pontos e premiações, como carros, viagens, telefones etc. Mas isso acontece em qualquer segmento do mercado. Quase todas as grandes empresas nacionais e multinacionais premiam os melhores distribuidores com bônus e viagens. Não raramente, uma empresa que utiliza o marketing multinível de forma legítima e que faz um enorme sucesso, começa a descer a ladeira, despencando em vendas e margens, o que, no final, pode acarretar uma situação de inadimplência geral e até falência, deixando credores sem receber o que lhes era devido. O cenário acima fica pior se a empresa se transforma numa pirâmide financeira, atraindo consequências inclusive de ordem criminal. Nesses casos, os líderes também respondem pelas dívidas da empresa? Como regra, não respondem, ou seja, não são solidários aos problemas financeiros da empresa. A jurisprudência corrobora o meu pensamento: “ (…) No caso dos autos, verifica-se que a autora investiu de forma livre e consciente na empresa de marketing multinível denominada (…), não cabendo ao réu, outro investidor do sistema, arcar com os prejuízos da autora perante o negócio realizado. Recurso desprovido. Sentença mantida”. – TJDF – Relator Desembargador Josaphá Francisco dos Santos – Julgado em 19/07/2017. A exceção à regra fica por conta de ocasiões em que o líder for, mesmo que de forma oculta, um sócio efetivo da empresa; ou quando o líder tem consciência de que o negócio é uma pirâmide, ajuda a formatar a ilegalidade , participa de forma ativa do engano contra pessoas que acabam perdendo recursos e tem benefícios com os desmandos cometidos. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/12/lideres-respondem-por-dividas-de-empresa-de-multinivel/

Entenda a Lei Que Simplificou o Procedimento de Alteração do Nome

No dia 28 de junho de 2022 foi publicada a Lei nº 14.382/2022, cujo objetivo principal foi a criação do Sistema Eletrônico dos Registros Públicos (SERP), que modernizou, simplificou e unificou os sistemas de cartórios de todo país, desburocratizando o sistema cartorário nacional (a medida abrange os registros de imóveis, títulos e documentos civis de pessoas naturais e jurídicas). Além disso, a referida Lei permitiu que qualquer pessoa a partir dos 18 anos possa alterar seu nome direto no cartório de registro civil sem precisar apresentar justificativa, não sendo mais necessário recorrer ao Judiciário. Com o advento da Lei nº 14.382/2022, basta ao interessado comparecer junto ao cartório de registro civil, preencher o requerimento de troca de nome e apresentar o pedido para análise do tabelião. Segundo a Lei, a mudança do prenome poderá ser imotivada e apenas 1 (uma) vez, sendo que a averbação da alteração do prenome conterá: (i) o prenome anterior; (ii) os números do documento de identidade; (iii) de inscrição no Cadastro de Pessoas Físicas (CPF); (iv) de passaporte e (v) de título de eleitor. Observe que o legislador foi cauteloso, visto que para evitar fraudes processuais e favorecimento de infratores, os nomes anteriores obrigatoriamente deverão constar nos novos documentos. Já o sobrenome poderá ser alterado em mais de uma oportunidade, independentemente de autorização judicial, para: (i) inclusão de sobrenomes familiares; (ii) inclusão ou exclusão de sobrenome do cônjuge, na constância do casamento; (iii) exclusão de sobrenome do ex-cônjuge, após a dissolução da sociedade conjugal, por qualquer de suas causas; e (iv) inclusão e exclusão de sobrenomes em razão de alteração das relações de filiação, inclusive para os descendentes, cônjuge ou companheiro da pessoa que teve seu estado alterado. Neste ponto, merece destacarmos que um casal que vive numa união estável reconhecida por meio de uma escritura pública declaratória de união estável (formalizada em cartório), poderá requerer a inclusão de sobrenome de seu companheiro, a qualquer tempo, bem como alterar seus sobrenomes nas mesmas hipóteses previstas para as pessoas casadas. Também, o enteado ou a enteada, a partir dos 18 anos de idade e justificadamente, poderá requerer ao oficial de registro civil que, nos registros de nascimento e de casamento, seja averbado o nome de família de seu padrasto ou de sua madrasta, desde que haja expressa concordância destes, sem prejuízo de seus sobrenomes de família. Perceba, portanto, que a Lei nº 14.382/2022 facilitou, ampliou e desburocratizou o procedimento de alteração, inclusão e exclusão do nome, ao mesmo tempo em que trouxe medidas importantes para se evitar fraudes. Devem os cartórios de registro civil se adequarem, pois, com a facilitação do procedimento crescerá a demanda, já que antes da Lei entrar em vigor, além das possibilidades serem mais restritas, era necessário um processo judicial para a alteração do nome. David Roque Dias, associado de Carlos de Souza Advogados, especializado em Direito Civil, Contratos e Assuntos Societários. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/11/entenda-a-lei-que-simplificou-o-procedimento-de-alteracao-do-nome/

Novas Possibilidades de Negociação de Débitos Federais

Com a edição da Lei nº 14.375/2022, houve o incremento nas modalidades de negociação de débitos federais, o que permitirá a regularização fiscal de muitos contribuintes que hoje são devedores, inclusive aqueles que estão em recuperação judicial. Com as alterações incluídas no texto da Lei nº 13.988/2020, débitos que ainda estão no âmbito da Secretaria da Receita Federal, ou aqueles inscritos em dívida ativa da União, de suas autarquias e fundações públicas, na cobrança de créditos que seja da competência da Procuradoria-Geral da União, ou em contencioso administrativo fiscal, podem ser negociados com a redução de juros e multas, em condições especiais. Significa dizer que, além dos débitos tributários, poderão ser negociados outros débitos federais, como aqueles originados do INMETRO, IBAMA, ANVISA, SPU, ANTT, ANCINE e tantos mais, de natureza federal. Uma novidade de grande valia estabelecida pela Lei 14.374/2022 é a possibilidade de transação para os débitos que ainda estão na Receita Federal, inclusive aqueles que são objeto de discussão em processos administrativos, sem limitação, no que diz respeito à matéria discutida. Outro ponto que merece destaque é a possibilidade de utilização de créditos de prejuízo fiscal e de base de cálculo negativa da CSLL, na apuração do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da CSLL, até o limite de 70%, para amortização da dívida. Empresas que apresentaram resultado negativo podem ser beneficiadas, pois a quitação dos débitos poderá ser feita com a utilização de prejuízo fiscal. Além de ampliar a transação tributária, a nova lei aumentou os descontos a serem concedidos, cujo limite passou de 50% para 65% do débito. O prazo de parcelamento também foi estendido para 120 meses. Dentre os benefícios incluídos pela Lei está a possibilidade de uso de precatórios ou de direito creditório com sentença de valor transitada em julgado para amortização do débito. Apesar da concessão dos benefícios estar sujeita à avaliação da Procuradoria, os contribuintes têm maior acesso para negociar, demonstrar sua capacidade de pagamento e obter as melhores condições. Portanto, a informação sobre as melhores condições e apresentação das informações corretamente poderão contribuir para o maior benefício no momento de firmar a transação tributária. Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/08/novas-possibilidades-de-negociacao-de-debitos-federais/

Os Terrenos de Marinha e Sua Proteção Constitucional

Os terrenos de marinha e seus acrescidos estão previstos no texto constitucional como bens da União. Possuem sua origem no Brasil Colônia, ocasião da história em que o Império Português decidiu ceder áreas de sua titularidade para particulares. Logo, preocupou-se em proteger a costa brasileira de eventuais invasões estrangeiras, situação que colocaria em risco o território nacional. Assim, as primeiras legislações sobre o tema, estabeleceram critérios para a definição de sua área, viabilizado assim a proteção do território brasileiro. Os terrenos de marinha correspondem à faixa de 33 metros contados a partir do mar em direção ao continente, ou interior de ilhas costeiras, bem como rios e lagos que sofrem influência de marés. Importante destacar que os terrenos de marinha se inserem no conceito de bens públicos, sendo estes classificados como bens dominicais, integrando, portanto, o acervo patrimonial da Administração Pública. Nessa esteira, esses terrenos e imóveis estão sob dois regimes: de ocupação e de aforamento. No regime de ocupação, a União poderá reivindicar o direito de uso quando quiser, visto que, neste regime, os bens são de sua propriedade. Por sua vez, no regime de aforamento, o particular, quando morador, passa a ter domínio útil sobre parte do terreno, ficando dividida a área entre a União e o foreiro. As três principais rubricas vinculadas a esses terrenos, são: Foro, Taxas de ocupação e Laudêmio. Importante frisar que essas rubricas não possuem natureza tributária, sendo receitas públicas devidas à União Federal em razão do uso por terceiro de seus bens imóveis. O futuro comprador de um imóvel situado nessas áreas deve atentar-se à necessidade de pagamento dos dispêndios mencionados, visto que, em caso de transferência onerosa, entre vivos, do domínio útil do imóvel, este deverá suportar o pagamento do Laudêmio, em quantia correspondente a 5% (cinco por cento), do valor atualizado do domínio pleno do terreno. Por fim, é possível questionar na via administrativa e na via judicial a caracterização do imóvel como terreno de marinha, ou ainda, questionar sobre o aumento de cobranças realizadas, sendo aconselhável buscar a orientação de profissionais da área para análise do caso concreto. Kézia Miez Souza, associada de Carlos de Souza Advogados, atua na área de Direito Tributário. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/07/os-terrenos-de-marinha-e-sua-protecao-constitucional/

Nova Decisão do Superior Tribunal de Justiça Define a Recuperação Judicial do Produtor Rural

No mês findo, o Superior Tribunal de Justiça (STJ), a quem a Constituição Federal atribuiu a missão de pacificar a intepretação da lei federal do país, emitiu importante decisão acerca da recuperação judicial do produtor rural, e que agora passa a ser obrigatória para toda a magistratura nacional. O entendimento veio nos recursos especiais de nº 1905573/MT e 1947011/PR. Essa obrigatoriedade vem do fato de que os recursos em questão foram dirimidos sob o regime legal de “recursos repetitivos”. Ou seja, neste julgamento o STJ produziu um precedente que é uma decisão qualificada que deverá resolver todos os casos futuros em que tenha aplicabilidade. Antes do advento dessa decisão, cumpre-nos recordar que o cenário forense era de nebulosidade. É que parte da magistratura seguia a corrente que entende que o produtor rural não poderia pedir a recuperação judicial sem comprovar que há mais de dois anos exercia atividade empresarial e tinha registro correspondente nos órgãos estatais. Por sua vez, outra parcela da magistratura seguia a outra corrente, sobre a qual nos filiamos, que compreendia possível a recuperação judicial do produtor rural sem tais exigências, porque a lei confere tratamento diferenciado e simplificado a ele, e o legislador específico da recuperação judicial se preocupara mais com a verificação fática da exploração da atividade econômica apta a ser recuperada no caso de crise econômica, do que com formalidades ao exercício da atividade empresarial. Essa divergência era pautada nos artigos 966, 970 e 971, da Lei nº 10.406/2022 (Código Civil), e no artigo 48 da Lei nº 11.101/2005, que em 2020 recebeu o artigo 70-A, o qual passou a expressamente prever o acesso do produtor rural ao plano de recuperação judicial especial, entendido como mais simples em comparação com o plano de recuperação judicial ordinário. O que agora o STJ definiu, portanto, foi que o produtor rural que exerça sua atividade de forma empresarial há mais de dois anos, tem a faculdade de requerer a recuperação judicial desde que esteja inscrito na Junta Comercial no momento em que formalizar o pedido no guichê da Justiça. Ou seja, para pedir a recuperação judicial o produtor rural não precisa comprovar que está inscrito como empresário nos órgãos estatais há mais de dois anos, e sim que esteja exercendo atividade empresarial há mais de dois anos. Acreditamos que o STJ já poderia ter solucionado toda essa controvérsia há muito mais tempo, evitando, inclusive, falências e disputas judiciais desnecessárias. Afinal, o agronegócio é mercado de altíssima relevância no Brasil e no mundo, representando apenas em nosso país, no ano de 2021, cerca de 27,4% do seu Produto Interno Produto (PIB), a maior taxa desde de 2004, com crescimento de 8,36% segundo apontou o Centro de Estudos Avançados em Economia Aplicada (CEPA). Raphael Wilson Loureiro Stein é Associado do Escritório desde abril de 2019 e atua nas áreas: Contencioso Civil, Comercial e Recuperação de Empresas e Falência. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2022/07/06/nova-decisao-do-superior-tribunal-de-justica-define-a-recuperacao-judicial-do-produtor-rural/