É Possível Alterar o Regime de Bens Após o Matrimônio?

Conforme regramento do Código Civil, no capítulo destinado aos efeitos Jurídicos do Casamento, o regime de bens – conjunto de regras disciplinadoras das relações patrimoniais oriundas do casamento, relativas ao domínio e à administração de ambos ou de cada um dos cônjuges quanto aos bens trazidos ao casamento e aos adquiridos durante a união – uma vez escolhido pelo casal, tornava-se irrevogável. Importante pontuar que, mesmo antes da alteração legislativa que permite, atualmente, a alteração do regime de bens adotado na oportunidade do casamento,  o rigor da regra era amenizado, mediante a previsão de exceções legais à inalterabilidade do regime de bens no curso do casamento (v. g., art. 7º, § 5º, da então Lei de Introdução ao Código Civil Brasileiro, permitindo a adoção do regime de comunhão parcial de bens ao estrangeiro casado que se naturalizasse brasileiro; Súmula 377/STF, admitindo a comunicação dos bens adquiridos na constância do casamento selado pelo regime da separação de bens). Contudo, em inovação à matéria, o atual Código Civil do ano de 2002, em seu art. 1.639, § 2º, nas Disposições Gerais referentes ao casamento, afirma ser “admissível a alteração do regime de bens, mediante autorização judicial em pedido motivado de ambos os cônjuges, apurada a procedência das razões invocadas e ressalvados os direitos de terceiros”. Muito se questionou, perante os tribunais superiores, se esta nova regra, que permite a alteração do regime adotado pelos nubentes, se aplicaria aos casamentos contraídos anteriormente ao então “novo” Código Civil Brasileiro, posto que a Constituição Federal possui o princípio consagrado em seu art. 5º do respeito ao ato jurídico perfeito. Por força daquela nova ordem, o STJ firmou-se no sentido de admitir a mudança de regime, mesmo em casamentos contraídos anteriormente ao Código Civil de 2002, passando de qualquer regime para outro, mas desde que não se enquadre em vedações expressas  para a sua escolha, a exemplo dos incisos no art. 1.641 (art. 258 do Código de 1916), e que envolvem o casamento de pessoas que infringem as causas suspensivas, e de pessoas com mais de sessenta e cinco anos. Assim, na interpretação dada pelas cortes superiores do art. 2.039 do CC/2002, há possibilidade de alteração convencional do regime de bens com relação aos casamentos ocorridos antes do novo Estatuto Civil, desde que ressalvados os direitos de terceiros e apuradas as razões invocadas pelos cônjuges para tal pedido, a teor do que dispõe o art. 1.639, § 2º, do CC/2002. Desta feita, o art. 1.639, § 2º, do código de 2002, permissor da alteração dos regimes de bens na vigência dos casamentos, constitui-se em norma geral relativa aos direitos patrimoniais dos cônjuges, e incide imediatamente, inclusive às sociedades conjugais formalizadas sob a égide do então  Código Civil de 1916, afastando a vedação constante do art. 230 do CC/1916, ressalvadas algumas vedações já mencionadas. Ressalte-se, por fim, não haver que se confundir o denominado efeito imediato do art. 1.639, § 2º, do CC/2002 (conquanto equiparado, segundo alguns autores, ao denominado efeito retroativo mínimo, mitigado ou temperado), preconizado de modo expresso pelo art. 2.035 do CC/2002, com retroatividade genérica das leis, vedada, em regra, pela Magna Carta em atenção ao ato jurídico perfeito, ao direito adquirido e à coisa julgada (art. 5º, XXXVI, da CF/88). Destaca-se que os bens adquiridos antes de prolatada a decisão judicial que venha a alterar o regime de bens remanescerão sob os ditames do pacto de comunhão – parcial ou total – estabelecido quando do casamento: o novo regime de separação total de bens incidirá apenas sobre bens e negócios jurídicos adquiridos e contratados após a decisão judicial que autorizar, nos termos do art. 1.639, § 2º, do CC/2002, a modificação incidental do regime de bens. Chrisciana Oliveira Mello, sócia de Carlos de Souza Advogados, aluna especial do curso de mestrado em Processo Civil da Universidade Federal do Espírito Santo. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/24/e-possivel-alterar-o-regime-de-bens-apos-o-matrimonio-2/

Pagamento à Vista Ou no Cartão, Eis a Questão

Realizar aquela compra tão desejada pode trazer algumas dúvidas na hora do pagamento. Afinal, pode haver diferenciação de preço para pagamento à vista (dinheiro) ou no cartão? Apesar de não parecer fazer muito sentido alertar para tal questão, a verdade é que muitas pessoas ainda se sentem injustiçadas quando informadas sobre a diferenciação na hora do pagamento dependendo da modalidade escolhida. Mas sim, é direto de o lojista precificar de forma diferente a depender da modalidade ofertada ao consumidor. Tal conduta tem respaldo na Lei 13.455 de 26 de junho de 2017. O art. 1º da referida lei dispõe claramente sobre a possibilidade da diferenciação de preço de bens e serviços oferecidos ao público em decorrência do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado. É importantíssimo dizer que a utilização na diferenciação de preços é facultativa ao lojista, ou seja, apesar da lei, não existe qualquer obrigatoriedade em sua aplicação (oferecimento de desconto a depender da modalidade de pagamento e do prazo). Todavia, o consumidor não pode ser pego de surpresa. O texto legal, em seu parágrafo único, dispõe que “o fornecedor deve informar, em local e formato visíveis ao consumidor, eventuais descontos oferecidos em função do prazo ou do instrumento de pagamento utilizado”. Logo, cabe ao lojista ou fornecedor de serviço cientificar o consumidor, antes do momento de pagamento, sobre a diferenciação de preços em virtude da forma de pagamento e prazo, facultando-lhe a escolha que melhor lhe apraz. Por fim, é importante destacar que pela ausência de informação como previsto em lei, o lojista ou o fornecedor de serviços ficará sujeito às sanções previstas no Código de Defesa do Consumidor. Rovena Roberta S. Locatelli Dias, sócia de Carlos de Souza Advogados, especializada em Direito Civil, Médico, Comercial e Imobiliário. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/23/pagamento-a-vista-ou-no-cartao-eis-a-questao/

A Responsabilidade das Construtoras Pelo Atraso na Entrega do Imóvel – Conheça Seus Direitos

O construtor assume perante o consumidor responsabilidade civil a partir da contratação. Tal responsabilidade abrange desde as obrigações ajustadas através das cláusulas do contrato, até aquelas atinentes a questões de ordem pública, como, por exemplo, a segurança da obra. A responsabilidade que nasce do contrato firmado entre construtora e consumidor também abrange o prazo de entrega do imóvel, o qual, sendo descumprido, gera à construtora o dever de indenizar. Acerca deste prazo, como regra geral, os contratos de compra e venda contam com a chamada “cláusula de tolerância”, através da qual prorroga-se automaticamente em 180 dias o prazo de entrega do imóvel, quando excedido prazo de entrega inicial. O desrespeito ao prazo citado, sem justificativa plausível, é inclusive uma das hipóteses de rescisão contratual pelo comprador do imóvel, por inadimplemento da construtora, sendo autorizado que este solicite a devolução integral dos valores pagos à construtora. Na hipótese de a obra sequer ter sido iniciada, ou mesmo estiver longe de terminar, é possível que o comprador pleiteie desde logo a rescisão do contrato, se restar comprovado que a obra não será entregue dentro do prazo estipulado, independentemente da aplicação da cláusula de tolerância. Ou seja, a responsabilidade da construtora, nesses casos, possui caráter objetivo, uma vez que há obrigação com o resultado, o que inclui a entrega do imóvel em perfeito estado de acabamento, na forma descrita no contrato e dentro do prazo estipulado no contrato. Portanto, o consumidor é igualmente resguardado no que se refere aos contratos de compra e venda de imóveis, podendo, inclusive, ser decretada a nulidade de cláusulas que forem consideradas abusivas ou que o coloquem em risco ou desvantagem perante a construtora. Por isso mesmo, a proteção ao consumidor também ocorre quando há desrespeito ao prazo de entrega do imóvel, e para estes casos, há previsão de que a devolução do valor do imóvel ao comprador seja imediata e em parcela única, sendo consideradas abusivas as cláusulas contratuais que determinam a devolução parcelada ou somente na conclusão da obra. Mayara Ferraz Loyola Rufino é associada de Carlos de Souza Advogados e atua na área Contencioso Cível. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/22/a-responsabilidade-das-construtoras-pelo-atraso-na-entrega-do-imovel-conheca-seus-direitos/

Isenção do Imposto de Renda Para Pessoas com Câncer de Próstata

A Lei n. º 7.713/1988 (Lei do Imposto de Renda) e o Decreto n. º 9.580/2018 (Regulamento do Imposto de Renda) preveem isenção do Imposto de Renda (IR) da pessoa física relativo aos rendimentos de aposentadoria, reforma e pensão, inclusive as complementações, quando o aposentado ou pensionista for acometido de doença grave. Nesta hipótese, é necessário frisar que a isenção do Imposto de Renda é destinada exclusivamente para os rendimentos de aposentadoria e pensão; ou seja, rendimentos do trabalho assalariado e os rendimentos de alugueis, por exemplo, não são abrangidos por essa modalidade de isenção. Vale destacar que a origem dos proventos não se restringe à previdência pública. Valores de complementação de aposentadoria, reforma ou pensão recebidos por entidades de previdência complementar, fundos de aposentadoria, Programa Individual (Fapi) e programa gerador de benefício livre (PGBI), também são contemplados pela isenção. Da mesma forma, são isentos os rendimentos de pensão obtidos por acordo ou decisão judicial, por escritura pública e até alimentos provisionais recebidos por portadores de moléstia grave. Segundo entendimento do Superior Tribunal de Justiça, o rol de doenças previsto no artigo 6º, XIV da Lei 7.713/1988 e no Artigo 35 do Decreto do Imposto de Renda é taxativo, ou seja, somente as pessoas portadoras das doenças ali mencionadas expressamente poderão ser contempladas com o direito à isenção do IR. O câncer de próstata é uma das manifestações de neoplasia maligna e, portanto, faz parte do rol de doenças graves que recebem a aludida isenção. Tem-se, então, que a mencionada isenção é destinada a facilitar o custeio do tratamento dessa enfermidade, uma vez que nosso sistema de saúde público é limitado. Deve-se levar em consideração que o tratamento de uma doença grave, como é o caso do câncer, é bastante oneroso e, muitas vezes, envolve uma equipe multidisciplinar. Tais despesas podem contemplar gastos com a contratação de médicos especialistas, exames e medicações, além de possuir, por muitas vezes, a necessidade de contratação de serviços de outros profissionais da área da saúde, tais como psicólogos e enfermeiros. A previsão da isenção na lei possui a finalidade de diminuir o sacrifício financeiro suportado pelo aposentado e pensionista, uma vez que, nem sempre, tais despesas são cobertas pelo plano de saúde ou custeadas pelo Sistema Único de Saúde (SUS). Para solicitar a isenção do Imposto de Renda, o contribuinte deverá procurar a sua fonte pagadora, que indicará o local em que o exame será realizado, munido de requerimento fornecido pela Receita Federal. Faz-se necessário reunir toda a documentação referente ao diagnóstico e confirmação da doença grave, pois o direito à isenção será concedido através de laudo pericial. É necessário que conste do laudo a data de início da doença, pois a Administração ou Instituto Nacional da Seguridade Social (INSS) irá considerar a data de elaboração do laudo médico como o marco inicial da isenção do Imposto de Renda da pessoa física. Constando no laudo a data do início dos sintomas dessa doença, a isenção irá retroagir até a referida data. Por fim, importa ressaltar que o contribuinte portador da moléstia grave, ainda que aposentado ou pensionista, deverá continuar apresentando a sua declaração anual de ajuste, uma vez que a isenção não desobriga o contribuinte de apresentar tais declarações, ainda que este seja isento de pagar o imposto. Kezia Miez Souza, associada de Carlos de Souza Advogados, atua na área de Direito Tributário. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/19/isencao-do-imposto-de-renda-para-pessoas-com-cancer-de-prostata/

O Horror Dos Crimes Sexuais

Infelizmente, ainda vivemos o horror de uma grande incidência de crimes sexuais, na quase totalidade das vezes praticados contra mulheres. Uma parcela dessas mulheres vitimadas é constituída por crianças e adolescentes. Vamos esclarecer didaticamente quais são esses crimes sexuais, como eles se caracterizam e as penalidades estabelecidas na lei. – O que é o assédio sexual? De acordo com a legislação brasileira, o assédio sexual é enquadrado como um crime contra a dignidade sexual, sendo definido no artigo 216-A do Código Penal como o ato de “constranger alguém com o intuito de obter vantagem ou favorecimento sexual, prevalecendo-se o agente da sua condição de superior hierárquico ou ascendência inerentes ao exercício de emprego, cargo ou função”. Assim, nos termos da lei, o assédio é considerado crime quando praticado por superior hierárquico ou equivalente, seja pelo simples constrangimento da vítima, ou pela prática reiterada de atos constrangedores. No entanto, há situações em que o assédio pode configurar outros crimes mais graves, como a importunação sexual e até o estupro. – Que atos configuram o assédio sexual? O assédio sexual pode ser configurado através de condutas abusivas desempenhadas por meio de palavras, comportamentos, atos, gestos ou escritos, que podem trazer danos à personalidade, à dignidade ou à integridade física ou psíquica de uma pessoa. Tentativas de beijos, toques indesejados, comentários, mensagens e gestos com conotação sexual, convites insistentes para carona ou para saírem juntos, quando envolvem diferença hierárquica e constrangimento da vítima, caracterizam assédio. A pena é de 1 (um) a 2 (dois) anos de detenção. – O que é a importunação sexual? O crime de importunação sexual, acrescentado ao Código Penal pela Lei n° 13.718/18, é caracterizado pela realização de ato libidinoso na presença de alguém de forma não consensual, com o objetivo de “satisfazer a própria lascívia ou a de terceiro”, conforme dispõe o Art. 215-A do Código Penal. O caso mais comum é o assédio sofrido por mulheres em meios de transporte coletivo e festas, mas também enquadra ações como beijos forçados e passar a mão no corpo alheio sem permissão. O infrator pode ser punido com prisão de um a cinco anos. Podem ser considerados atos libidinosos, práticas e comportamentos que tenham finalidade de satisfazer desejo sexual, tais como: apalpar, lamber, tocar, roçar, desnudar, dentre outros. A pena é de 1 (um) a 5 (cinco) anos de reclusão. – Como pode-se provar o assédio sexual e a importunação sexual? Apesar de provas de crimes sexuais serem mais difíceis de ser colhidas, uma vez que na maioria das vezes são praticados às escondidas, sem testemunhas diretas, é importante saber que, para a jurisprudência brasileira, quando o relato da vítima é somado a algum elemento externo já deve ser entendido como comprovação suficiente para uma condenação. Nesse caso, não é preciso uma imagem ou que alguém que tenha visto o que aconteceu. As provas podem ser posteriores, por exemplo, com um laudo sobre o impacto emocional na vítima, ou então uma testemunha com quem ela tenha conversado imediatamente após o ocorrido. Além disso, usar o celular como meio de produção de provas é muito válido, por meio da gravação ambiental das tentativas do assediador, por exemplo, podendo ser feita por vídeo ou áudio. Não é necessário que o assediador tenha conhecimento da gravação, não se precisa de autorização para a gravação da voz ou rosto do assediador. – E o estupro? O estupro é o ato de “constranger alguém, mediante violência ou grave ameaça, a ter conjunção carnal ou a praticar ou permitir que com ele se pratique outro ato libidinoso”. Na prática, o agressor força a realização de um ato sexual contra a vontade da vítima usando, para isso, de violência ou de uma grave ameaça, como por exemplo uma arma ou um aviso de que pode matar alguém envolvido com ela. Pode ser considerado estupro mesmo que não haja penetração, como se costuma acreditar. Considerado um crime hediondo, tem a pena agravada quando se trata de menor de idade ou se há lesão ou morte da vítima. A pena pode variar de 6 a 10 anos de reclusão, aumentando para 8 a 12 anos se há lesão corporal ou se a vítima tem entre 14 a 18 anos. Ainda pode subir para 12 a 30 anos de reclusão quando há morte. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Letícia Stein Carlos de Souza, Acadêmica do 4º. Período da Faculdade de Direito de Vitória e Estagiária de Direito. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/18/o-horror-dos-crimes-sexuais/

A Nova Lei de Crimes Cibernéticos

Em maio do presente ano, foi sancionada a Lei nº 14.155/21, conhecida com a Lei de Crimes Cibernéticos. O intuito principal de tal lei é alterar e tornar mais grave diversos crimes contidos no Código Penal Brasileiro, tais como: o crime de violação de dispositivo informático, furto e estelionato cometidos de forma eletrônica ou pela internet. Além dessas alterações, a nova lei também muda o Código de Processo Penal, definindo a competência em modalidades de estelionato. Historicamente, até o ano de 2012, o Brasil não possuía previsões específicas e concretas para crimes de violação ou invasão de sistemas ou dispositivos digitais, somente existindo algumas determinações vagas na Lei de Interceptações, ou hipóteses de alguns crimes cometidos por funcionários públicos contra a administração pública. Entretanto, em decorrência de fatos envolvendo o vazamento de fotos íntimas da atriz Carolina Dieckmann, o Brasil, através de seus legisladores, percebendo a lacuna existente sobre o assunto, criou a Lei nº 12.737/2012, conhecida como Lei Carolina Dieckmann, que criou os artigos 154-A e 154-B do Código Penal Brasileiro, não recebendo alterações até maio do ano de 2021. A recente criação agrava as punições previstas no Código Penal acerca de crimes cometidos através de dispositivos eletrônicos, ou seja, crimes cibernéticos. De acordo com o texto da lei, os crimes de violação de dispositivo informático, furto e estelionato cometidos de forma eletrônica ou pela internet, ficaram ainda mais graves. Com a nova legislação, a punição que anteriormente era detenção de três meses a um ano e multa passou a ser de um a quatro anos de reclusão e multa, desta forma, ganhando um status de maior reprovabilidade para os criminosos. A lei sancionada prevê que a pena de reclusão seja aplicada em condenações mais severas e o regime de cumprimento pode ser fechado. Já a detenção é aplicada para condenações mais leves e não admite que o início do cumprimento seja em regime fechado. A referida penalidade vale para aquele que invadir um dispositivo a fim de obter, adulterar ou destruir dados ou informações sem autorização do dono, ou ainda instalar vulnerabilidades para obter vantagem ilícita. Já se a invasão provocar obtenção de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas ou o controle remoto não autorizado do dispositivo invadido, a pena será de reclusão de dois a cinco anos e multa; tal pena, anteriormente, era de seis meses a dois anos e multa. Ademais, para casos em que haja prejuízo econômico, o texto sancionado prevê que a pena pode aumentar de um a dois terços. Já se a invasão do dispositivo levar ao acesso de conteúdo de comunicações eletrônicas privadas, segredos comerciais ou industriais, informações sigilosas ou ao controle remoto não autorizado do dispositivo invadido, a pena imposta pode variar de dois a cinco anos de reclusão. De forma individual, com relação ao furto qualificado, cumpre destacar que acontece quando as condições do crime envolvem, por exemplo, destruição de algum obstáculo, como uma fechadura, fraude ou concurso entre pessoas. A lei acrescenta ao Código Penal a agravante do furto qualificado por meio eletrônico, com ou sem a violação de mecanismo de segurança ou a utilização de programa malicioso, ou por qualquer outro meio fraudulento similar. Nesse caso, a pena será de reclusão de quatro a oito anos e multa, conforme a redação do Art. 155, parágrafo 4°- B, da referida lei. Vale salientar que, se o crime supracitado for praticado contra idoso ou vulnerável, a pena aumenta de um terço ao dobro. E, se for praticado com o uso de servidor de informática mantido fora do país, o aumento da pena pode ir de um terço a dois terços. Assim, nota-se que o Brasil demorou a tomar previdências para julgar e processar crimes da natureza cibernética, sendo necessária a ocorrência de fatos envolvendo a atriz Carolina Dieckmann para que os legisladores tomassem providências. Contudo, após a criação da lei nº 12.737/2012 e da lei 14.155/2021, se tem por verdade que cada vez mais as autoridades brasileiras estão se preocupando com assuntos envolvendo crimes cibernéticos, e por consequência, criando e atualizando leis já existentes. Samuel Lourenço Kao Yien, associado de Carlos de Souza Advogados, atua na área de Direito Criminal. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/17/a-nova-lei-de-crimes-ciberneticos/

É Constitucional a Regulamentação do FAP Por Decreto

Em julgamento realizado na última quarta-feira, o Plenário do Supremo Tribunal Federal (STF) fixou a seguinte tese: ‘O Fator Acidentário de Prevenção (FAP), previsto no art. 10 da Lei nº 10.666/2003, nos moldes do regulamento promovido pelo Decreto 3.048/99 (RPS) atende ao princípio da legalidade tributária (art. 150, I, CRFB/88)”. A tese foi fixada no Recurso Extraordinário (RE) 677725, julgado em conjunto com a Ação Direta de Inconstitucionalidade (ADI) 4397. O FAP, previsto no Decreto 3.048/99, é um coeficiente utilizado para delimitar a progressividade das alíquotas básicas da contribuição das empresas para os riscos ambientais do trabalho (RAT). Na realidade, as alíquotas da contribuição para o RAT são fixadas pelo art. 22, II da Lei nº 8.212/91 e variam de 1% a 3%, de acordo com o grau de risco de atividade da empresa. A redução das alíquotas fora autorizada expressamente pelo art. 10 da Lei nº 10.666/2003. Como a sistemática de aplicação do FAP está prevista em um decreto, muito se questionou sobre a legalidade e constitucionalidade da aplicação desse coeficiente no cálculo da contribuição previdenciária destinada ao RAT. O Superior Tribunal de Justiça (STJ) já havia enfrentado a questão para afastar a alegação de ofensa ao princípio da legalidade, no julgamento do Recurso Especial (REsp) 392.355/RS). Isto significa que o fato da forma de aplicação do FAP estar previsto em decreto, que é ato regulamento originário do Poder Executivo, não retira sua legalidade, uma vez que as alíquotas estão fixadas em lei, assim como a aplicação do próprio FAP. Agora, com a fixação da tese pelo plenário do STF sobre a constitucionalidade do FAP, na forma como prevista no decreto, a aplicação do coeficiente deve ser observada pelas empresas sujeitas à contribuição. Nesse caso, aconselha-se que o empresário esteja atendo à fixação do grau de risco de seu negócio para a alíquota seja adequadamente aplicada. Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/12/e-constitucional-a-regulamentacao-do-fap-por-decreto/

Tutela dos Animais de Estimação em Casos de Divórcio

– Em caso de dissolução do vínculo matrimonial, quem fica com o animal de estimação? Por muito tempo os animais foram considerados como bens móveis, ou seja, “coisas” perante o Código Civil. Entretanto, a situação vem sendo flexibilizada pelo Poder Judicial, sendo admissível até a “guarda compartilhada” dos pets. – Guarda compartilhada dos pets? É isto mesmo? Exatamente! A guarda compartilhada do animal de estimação prioriza o bem-estar do pet, permitindo que ele mantenha o contato com ambos os tutores e receba o carinho como de costume. O ideal é que haja um acordo entre as partes, estabelecendo as condições de moradia, trato, horário de visitas, divisão de despesas (tais como alimentação, veterinário etc.) e acordos para o cruzamento e a venda do animal ou de suas crias. É notório, dessa forma, que o melhor interesse do animal e dos donos seja o critério principal a ser contemplado pelas decisões. Os juízes têm admitido esse cenário jurídico! – E se não houver consenso sobre o animal de estimação no processo de divórcio? Caso não haja um consenso, a guarda e os direitos com o animal serão fixados por um juiz que decidirá visando sempre o equilíbrio dos interesses das partes e do animal. Uma vez determinado o regime de guarda, pode levar um tempo até que o pet se adapte à nova rotina. Sendo assim, é necessário o trabalho conjunto dos dois tutores para garantir que o processo ocorra da forma mais rápida e tranquila possível. – No caso de uma efetiva disputa judicial sobre a guarda do pet, quais recursos o juiz poderá usar para chegar a uma decisão? O juiz deverá nomear um perito, neste caso um médico veterinário, para aferir o relacionamento do casal com o animal de estimação e verificar as melhores condições para a guarda dele. O parecer do perito pode ser no sentido de que a guarda seja somente de um dos dois ou a compartilhada. Há de se destacar que em muitos casos o animal de estimação está intimamente ligado a um filho, criança ou adolescente. Neste caso, a tendência é que o juiz decida acompanhando o que for deliberado sobre a guarda do filho. – E aquele que sair da residência comum ou abandonar o lar, vai poder continuar a conviver com o pet? Sim. Como já mencionado, o dono que sair da residência ou mesmo a abandonar poderá visitar o pet com frequência. Apesar de haver uma omissão legislativa sobre o assunto, a prática no Direito mostra que a relação afetiva desenvolvida entre um tutor e o seu animal de estimação jamais pode ser desprezada, mesmo que esse dono tenha sido um péssimo cônjuge e até deixado a habitação familiar. – A quem caberão as despesas inerentes aos cuidados do animal? Para a manutenção do bem-estar do animal, os donos, mesmo que separados pelo divórcio ou pela dissolução da união estável, contribuirão na proporção de seus recursos, de forma análoga ao Art. 1.703 do CC (“Para a manutenção dos filhos, os cônjuges separados judicialmente contribuirão na proporção de seus recursos”), apesar da guarda dos animais de companhia não seguir exatamente a mesma regra da guarda dos filhos, diante das peculiaridades desta. Deverá ocorrer ajuda de custo, assemelhando-se à pensão alimentícia, pois os animais, assim como as crianças, demandam cuidados com a saúde, a alimentação e o lazer, o que gera despesas que devem ser suportadas por seus donos. – Há casos em que o registro do animal está em nome de apenas um dos cônjuges. Isto pode influenciar no direito de guarda? Pode, e muito! Esse cuidado deve ser tomado. No momento da “aquisição” do pet, para evitar-se futuros conflitos sobre a “propriedade” e direito de guarda, o ideal é que ambos constem dos documentos do animal. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Letícia Stein Carlos de Souza, Acadêmica do 4º. Período da Faculdade de Direito de Vitória e Estagiária de Direito. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/11/tutela-dos-animais-de-estimacao-em-casos-de-divorcio/

Desmistificando o Auxílio-Reclusão

Muitos acreditam que o auxílio-reclusão é um benefício oferecido ao preso em regime fechado, somente por estar preso. Entretanto, existem diversos requisitos para que haja a concessão do benefício que não é dado em favor do recluso, mas sim aos seus dependentes. O auxílio-reclusão foi instituído originalmente em agosto de 1960, através da Lei Orgânica da Previdência Social, Lei nº 3.807/60. Atualmente, o auxilio reclusão tem amparo na Lei nº 8.213/91, que dispõe sobre os Planos de Benefícios da Previdência Social, em artigo 80 e seguintes. Cumpre destacar que tal auxílio é um direito previdenciário voltado exclusivamente aos dependentes do segurado que se encontra preso em regime fechado, e que não receba remuneração da empresa em que trabalhava, nem esteja gozando de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência de serviço, ou seja, voltado aos dependentes do segurado de baixa renda que foi preso.  Ademais, destaca-se que se enquanto recluso, o preso vier a falecer, automaticamente o auxílio-reclusão é convertido em pensão por morte. O valor do auxílio-reclusão é de um salário-mínimo, e caso o recluso tenha mais de um dependente, divide-se em partes iguais, a depender de cada classe de dependentes, que pode ser dividida em 3 classes, tendo a primeira classe preferência sobre as demais, e a segunda classe preferência sobre a terceira: Classe 1 – cônjuge/companheiro e filhos. É uma classe na qual os dependentes têm uma relação familiar muito próxima com o segurado detido, assim, tem-se a dependência considerada presumida, não sendo necessário que comprove que era dependente do segurado. Classe 2 – pais. Em tal classe, é necessário comprovar que existe a dependência para que tenham direito ao auxílio. Classe 3 – irmãos. É dependente o irmão não emancipado, menor de 21 anos e o irmão que seja inválido ou com deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave, de qualquer idade, devendo comprovar que é dependente. Outro mito criado, é que o detendo precisa obrigatoriamente trabalhar durante sua reclusão para que seus dependentes tenham direito ao benefício. Contudo, mesmo na hipótese de não trabalhar enquanto encarcerado, seus dependentes não ficarão sem o auxílio. Em contrapartida, na hipótese de trabalhar enquanto detento, contribuirá como segurado do tipo facultativo, sem que seus dependentes fiquem sem receber o auxílio reclusão. Desta forma, conclui-se que o auxílio-reclusão é feito para que a família do preso não fique, de forma repentina, carente pelo fato da reclusão do segurado, principalmente se ele for o único provedor de renda. O pedido de auxílio-reclusão pode ser realizado totalmente pela internet, através do site https://www.gov.br/pt-br/servicos/receber-o-auxilio-reclusao Samuel Lourenço Kao Yien, associado de Carlos de Souza Advogados, atua na área de Direito Criminal. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/10/desmistificando-o-auxilio-reclusao/

Quais os Cuidados ao Entrar Numa Empresa de Marketing Multinível?

Toda empresa deve possuir contratos escritos para regular as suas mais diversas relações jurídicas. No caso de empresas de MMN, tenho sempre aconselhado que os líderes de rede também firmem contratos escritos com os seus divulgadores e afiliados. Seja como for, mesmo não estando redigido, o contrato não deixa de existir. A grande vantagem de se estabelecer os termos desse acordo no papel ou digitalmente, contudo, é que as relações entre as partes se tornam mais claras e, portanto, fica menos intrincada a exigência do cumprimento do combinado. Numa relação contratual, os contratantes são obrigados a guardar, assim na conclusão do contrato, como em sua execução, os princípios de probidade e boa-fé (artigo 422 do Código Civil). Os princípios de probidade e boa-fé encontram abrigo na própria essência da sociedade humana, pois tutelam todas as relações decorrentes do convívio social, como corolários do princípio da função social do contrato. Este princípio é basilar à própria dignidade da pessoa humana sob o qual se abriga todo o ordenamento jurídico pátrio do qual, nas relações privadas, sobressai o princípio da autonomia limitada da vontade. A realização da boa-fé pressupõe a conformação da conduta de acordo com o certo, possível de ser observado pelo homem, como condição para a exigibilidade de conduta diversa e aplicação de sanção pela violação da norma, o que exige coerência entre o ser, sua intenção e sua ação. De tal modo que a cláusula contratual que ofender a boa-fé é nula. Normalmente, o contrato a ser firmado entre a empresa que utiliza o MMN e a sua rede, e também pelos líderes e os seus divulgadores e afiliados, é um termo de adesão, ou seja, aquele que já vem pronto para ser assinado e que inclusive prevê as hipóteses e formas de desfazimento do negócio. A grande questão, e que exige meus comentários, é quando umas das partes não cumpre aquilo a que se obrigou quando da contratação das ferramentas de marketing multinível. Extinguir o contrato pelo decurso de tempo ou dando um aviso observando o prazo ajustado é simples. O problema reside nos descumprimentos, nas inadimplências. A empresa de MMN prometeu mundos e fundos; ótimos produtos ou serviços; treinamentos; comissões; prêmios; binários. Mas isso ficou restrito aos folhetos coloridos ou a belas páginas e vídeos na internet. Atrasos nos repasses dos valores devidos: o que fazer caso isso ocorra? Os divulgadores e afiliados poderão, além de cobrar o que foi prometido e não cumprido, optar pela extinção do contrato via rescisão. A resilição unilateral, nos casos em que a lei expressa ou implicitamente o permita, opera mediante denúncia notificada à outra parte (artigo 473 do Código Civil). Da mesma forma, a parte lesada pelo inadimplemento pode pedir a resolução do contrato, se não preferir exigir-lhe o cumprimento, cabendo, em qualquer dos casos, indenização por perdas e danos (artigo 475 CC). Destacando sempre que, sendo um contrato entre duas partes, nos contratos bilaterais, nenhum dos contratantes, antes de cumprida a sua obrigação, pode exigir o implemento da do outro (artigo 476 CC). Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/11/09/quais-os-cuidados-ao-entrar-numa-empresa-de-marketing-multinivel-2/