Como Caracterizar o Abandono de Emprego do Empregado?

O abandono de emprego (hipótese de justa causa), para que esteja caracterizado, necessita da presença de dois elementos: animus abandonandi (intenção de abandonar o emprego) e ausência ao serviço por período determinado. De acordo com a Súmula 32 do Tribunal Superior do Trabalho, o abandono de emprego é presumido na hipótese do empregado deixar de comparecer ao serviço sem apresentar justificativa, pelo prazo superior a 30 dias, podendo ser caracterizado em prazo inferior, por exemplo, na hipótese da empresa comprovar que o empregado já está trabalhando em outro local. É necessário, assim, que a empresa demonstre a ausência e o desinteresse do empregado em retornar ao trabalho. Mas como demonstrar essa intenção do empregado? Qual a forma mais eficaz e que não represente risco ao empregador? A forma mais eficiente é o envio de telegrama (ou similar) com cópia e aviso de recebimento, podendo ainda se feito de forma adicional com a utilização de meios telemáticos, como uma mensagem por whatsapp ou outro aplicativo que seja utilizado pelo empregado como forma de comunicação. Algumas empresas insistem em utilizar, através de publicação em jornal, o expediente de convocar o empregado para comparecer ao serviço sob pena de aplicação de justa causa por abandono de emprego, porém, essa forma de convocação é considerada pela doutrina e jurisprudência como pouco eficaz, na medida em que não se pode exigir que o empregado faça a leitura diária de jornais, podendo ainda, a depender da situação concreta, sujeitar o empregador ao pagamento de indenização por danos morais. E o que é pior: há alguns julgados que consideram ilícito o ato do empregado de publicação de convocação do empregado sob pena de dispensa por justa causa (abandono de emprego), por entender que essa forma de convocação expõe indevidamente o nome do empregador gerando lesão à imagem e honra subjetiva do empregado, sujeitando o infrator ao pagamento de indenização por danos morais. No entanto, há também decisões no sentido contrário, isto é, de que a publicação de convocação do empregado não implica, por si só, em ato ilícito capaz de ensejar o pagamento de indenização por danos morais, exigindo-se a comprovação da má-fé do empregador. Referidas decisões levam em conta a existência de outros meios de convocação anteriores à publicação em jornal de grande circulação, demonstrando que a utilização do expediente se deu como última alternativa diante da frustração das demais, como forma de se evitar a aplicação da pena máxima de rescisão contratual por justa causa. Assim, diante da divergência de entendimento a respeito da possibilidade ou não de publicação de convocação do empregado para comparecer ao serviço na hipótese de faltas injustificadas, é importante que o empregador dê preferência à convocação por telegrama com aviso de recebimento e cópia (ou similar) como forma de convocar o empregado, valendo-se ainda, de forma concomitante, da utilização de meios telemáticos, como aplicativos de mensagens sabidamente utilizadas pelo empregado, evitando-se, contudo, a utilização de redes sociais públicas. A publicação em jornal de grande circulação poderá até ser utilizada em último caso, mas desde que demonstrado que outras alternativas foram utilizadas anteriormente, limitada à convocação do empregado, evitando-se dizeres que possam macular a imagem do trabalhador.

Como Identificar Oportunidades e Riscos de uma Empresa?

A Auditoria Legal Jurídica, também comumente conhecida pela sua expressão equivalente em inglês, Due Diligence é um processo de revisão das informações de uma empresa ou organização, com o objetivo de validar e/ou confirmar oportunidades e riscos. Para que serve uma due diligence? (a) Identificar e gerenciar riscos de diversas áreas (ambiental, fiscal, trabalhista, cível etc.); (b) Confirmar a rentabilidade da operação; (c) Quantificação do patrimônio; (d) Conhecer melhor o funcionamento da empresa; (e) Entender melhor a gestão administrativa e contábil; (f) Conhecer o ambiente de controles internos; (g) Antecipar problemas e prever soluções. Tipos de Auditoria Legal Jurídica: Tributária; Trabalhista; Cível; Relações de Consumo; Legal; Contratual; Societária; Ambiental; Criminal. Informações necessárias para a execução da due diligence: Documentação interna (contratos, guias, certidões, balanços, sentenças, notas fiscais, extratos etc.); Levantamento de processos administrativos e judiciais no mais amplo espectro, visando aferir especialmente os valores envolvidos, status e riscos; Entrevistas com a administração; Outras informações. Resultados da Auditoria Legal: verificar o cumprimento das obrigações e o contingenciamento dos riscos de uma forma geral, especialmente: Comerciais estão calculadas de acordo com os contratos? Tributárias estão sendo corretamente calculadas e recolhidas? Financiamentos estão sendo cumpridos? Há cláusulas de “Default”? Societárias/estatutárias estão sendo consideradas? Os direitos dos sócios estão sendo preservados? Previdenciárias e atuariais estão adequadamente calculadas? Contratuais com terceiros estão sendo atualizadas? Contingências: (a) Contingências ativas – Por tratar-se de ganhos potenciais futuros, as contingências ativas não devem ser reconhecidas contabilmente, até que tenham sido eliminados todos os recursos possíveis para sua reversão. Em outras palavras, o ativo contingente somente poderá ser contabilizado quando se tornar líquido e certo (ou deixar de ser contingente); Em determinadas situações, o reconhecimento dos ativos contingentes pode ser decisivo para a tomada de decisão na negociação. (b) Contingências passivas – Como se tratam de potenciais perdas futuras, geralmente são as contingências passivas as maiores responsáveis pelas “quebras de negócio”; Podem ser de diversas naturezas, sendo as mais comuns as tributárias, previdenciárias e atuariais, trabalhistas, cíveis e de meio ambiente; são classificadas como de risco PROVÁVEL, POSSÍVEL ou REMOTO. Em due diligences jurídicas é realizada a análise dos riscos e, se possível, a quantificação de cada contingência, objetivando nutrir os sócios e gestores de informações suficientes para evitar eventuais “surpresas” no futuro.

Utilização de Créditos de ICMS para Quitação de Débitos

Foi prorrogado para 30 de dezembro de 2020 o prazo para as empresas que possuem créditos de Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços – ICMS, acumulados em razão de operações de exportação, realizar transação para compensar tais créditos com débitos inscritos em dívida ativa, próprio ou de terceiro. Em contrapartida, a empresa deverá apresentar projeto de desenvolvimento produtivo, comprometendo-se a investir para gerar operações no mercado nacional, com apuração do ICMS. Os créditos poderão ser utilizados pelo próprio contribuinte, ou por terceiros, para quitação de débitos do tributo, multas e juros, débitos inscritos em dívida ativa até 31 de dezembro de 2018, aquisição de equipamentos. A utilização dos créditos está prevista na Lei n. 11.001/2019, e regulamentada por Decreto 4628-R. A empresa exportadora, possuidora dos créditos acumulados em razão da não incidência do ICMS nas operações de exportação, poderão transferir seus créditos para outro estabelecimento ou terceiros situados no Espírito Santo. Os créditos também poderão ser transferidos para fornecedores situados fora do Estado, desde que essa operação seja autorizada por protocolo específico. O projeto de desenvolvimento produtivo deve ser de relevante interesse social e econômico, com o objetivo de gerar renda no Estado e atrair investimentos. Poderá ser financiado com os recursos oriundos da transferência dos créditos. Ao apresentá-lo, a empresa deverá apresentar o roteiro de projeto contendo as informações relativas aos investimentos programados, demonstrativo das repercussões econômicas, financeiras e tributárias do empreendimento, comunicação do impacto social e de infraestrutura, histórico da empresa ou do grupo empreendedor. Não poderão receber os créditos estabelecimentos importadores, e aquele que realize, exclusivamente, operações beneficiadas com redução da base de cálculo ou concessão de crédito presumido do ICMS, ou cujo débito tributário objeto da extinção seja referente a operações ou prestações sujeitas ao regime de substituição tributária. A possibilidade de utilização dos créditos acumulados de ICMS pelos exportadores ou por terceiro, é uma medida que visa possibilitar a regularização dos débitos, bem como alavancar a economia.

A Empresa Pode Proibir Relacionamento Amoroso Entre Empregados?

Não é novidade para nós que relacionamentos interpessoais dentro do ambiente de trabalho, em algumas situações, podem despertar sentimentos amorosos entre colegas de trabalho. Mas esta relação de namoro, dentro do ambiente de trabalho, gera bastante controvérsia, por diversos aspectos, dentre os quais, pode ser citado eventual queda da qualidade do serviço ou produtividade, o que faz com que muitos empregadores, ainda hoje, estabeleçam políticas internas no sentido de proibir relacionamento amoroso entre colegas de trabalho. Evidente que há situações em que o relacionamento entre empregados enamorados ultrapassam o limite do bom senso, e, muitas vezes, esquecendo-se que estão no ambiente corporativo, discutem ou mesmo se excedem no afeto mútuo, o que pode gerar inegável constrangimentos aos colegas, comprometendo rendimento no trabalho e o bom andamento das tarefas diárias, porém, tais fatos não autorizam a proibição pelo empregador. Diversas são as decisões proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho no sentido de considerar discriminatória a proibição de namoro através de normas institucionais da empresa, por ferir princípios constitucionais da dignidade do trabalhador, à intimidade, dentre outros. Em tais casos, as empresas normalmente são condenadas no pagamento de indenizações por danos morais pela prática de assédio moral, como ocorreu, por exemplo, nos autos do processo nº 0001101-12.2016.5.20.0008, em que o TRT da 20ª Região, considerou que a proibição de namoro constante na política interna da empresa, feriu os direitos da personalidade do trabalho. Mas o que o empregador pode fazer já que não pode proibir namoro? Com o objetivo de evitar excessos, é importante que o empregador crie regras claras, baseadas no bom senso, para que o trabalhador não seja “pego de surpresa”, ao ser advertido, no sentido de dizer que não sabia da existência de determinada regra. Mas o que fazer nos casos em que houver excessos por parte dos namorados? Apenas nesta situação é que os empregados poderão ser punidos, lembrando que deve ser conferida privacidade na conversa do empregador com o casal, devendo ressaltar que a empresa em nenhum momento é contra o relacionamento, no entanto, não devem se exceder nas manifestações amorosas no ambiente de trabalho. O comportamento do casal frente ao empregador deve ser sempre muito transparente, no sentido de não esconder a existência de um relacionamento amoroso, devendo sempre se atentarem para não trazerem problemas/discussões de ordem pessoal para o trabalho, evitando demonstrações públicas e exageradas de afeto, ou seja, o bom senso sempre deve prevalecer. Por fim, importante deixar claro que comportamentos desrespeitosos, se provados, não serão amparados pela Justiça do Trabalho, e, dependendo da gravidade, poderão ensejar até mesmo a dispensa por justa causa dos empregados envolvidos.

Apreensão de Documentos para Pagamento de Dívidas Trabalhistas

Há uma grande frustração quando um trabalhador entra na Justiça e não consegue efetivar o recebimento, mesmo depois de obter sentença que assegura direitos que não haviam sido respeitados pela empresa, muitas vezes em um processo que dura vários anos. Isto é muito comum: a Justiça concede os direitos ao trabalhador, aquilo é transformado num determinado valor, mas, na hora do pagamento, a empresa não cumpre e os responsáveis não possuem bens que possam satisfazer a obrigação. Em situações assim, alguns juízes trabalhistas têm interpretado uma norma legal e agido de forma extrema contra os empresários. O fundamento legal usado por juízes está no Código de Processo Civil, que permite ao julgador determinar medidas coercitivas nas ações que tenham por objeto prestação pecuniária, inclusive busca e apreensão. Firmadas nessas disposições, certas decisões judiciais contra empresários que não honram com as sentenças trabalhistas têm chegado ao ponto de determinar a apreensão de carteira de motorista, passaporte e cartão de crédito. Segundo entendimento constante das determinações judiciais, não seria admissível que alguém que deve a um trabalhador possa ficar fazendo viagens, usando cartão de crédito ou dirigindo um carro. Segundo uma dessas decisões judiciais: “Todas as medidas executivas cabíveis foram tomadas, sendo que o executado não paga a dívida, não indica bens à penhora, não faz proposta de acordo e sequer cumpre de forma adequada as ordens judiciais, frustrando a execução. Se o executado não tem como solver a presente dívida, também não pode ter recursos para viagens internacionais, ou para manter um veículo, ou mesmo manter um cartão de crédito”. Sem dúvidas é muito ruim uma obrigação deixar de ser cumprida, especialmente quando se trata de verba alimentar, que é o caso dos créditos trabalhistas. Num mundo perfeito, todos cumpririam fielmente com as suas obrigações pecuniárias. Porém, como essa perfeição nas relações humanas não existe, é preciso haver um comando judicial. O que não se pode, contudo, é afrontar princípios democráticos a despeito de cobrar uma dívida justa. É necessário que o assunto seja objeto de um debate no Congresso e se busque um mecanismo para dar mais efetividade às cobranças de dívidas trabalhistas. Isto é urgente! Realmente é lamentável ver um trabalhador sem esperanças por não ter recebido o que a Justiça lhe concedeu, enquanto o empresário devedor fica postando fotos em viagens caras! Por outro lado, não se pode, absolutamente, afrontar garantias fundamentais de uma pessoa, mesmo que esteja com dívidas trabalhistas; garantias como a dignidade humana e o direito à locomoção (ir e vir) são absolutos. Os tribunais trabalhistas têm sido maciços ao repelirem as decisões de juízes que determinam a apreensão de carteira de motorista, passaporte e cartão de crédito. O entendimento dos tribunais tem sido no sentido de que “não é razoável nem proporcional limitar tal direito como forma de compelir o devedor a pagar uma dívida, ainda que de natureza trabalhista. A suspensão da CNH e o recolhimento do passaporte das executadas, de claro caráter punitivo, não se revelam adequados ou úteis à finalidade visada, qual seja, o pagamento da dívida”. Acrescenta a decisão parcialmente transcrita: “No caso, o recolhimento da CNH dos devedores e de seus passaportes, além de não ter utilidade direta na satisfação do crédito exequendo, pois não permitirá o bloqueio de bens passíveis de garantir a execução, fere direitos fundamentais de ir e vir, que protegem inclusive os inadimplentes”.

É Possível Ajuizar Ação de Prestação de Contas Por Quem Paga Pensão Alimentícia?

A pensão alimentícia (juridicamente denominada como “alimentos”) é o valor pago a uma pessoa para o suprimento de suas necessidades básicas de sobrevivência e manutenção, devendo abranger, também, os custos com moradia, vestuário, educação, saúde, entre outras despesas. Em Direito de Família a obrigação de prestar alimentos é decorrente do parentesco ou da formação de uma família (matrimonial ou união estável, sendo devida àqueles que não possuem bens suficientes, nem podem prover, pelo seu trabalho, à própria mantença. No que se refere à pensão alimentícia paga aos filhos menores, recentemente o Superior Tribunal de Justiça (STJ) entendeu ser possível que o alimentante (quem paga a pensão alimentícia) promova ação para exigir contas (prestação de contas) contra o guardião do menor/alimentado (quem recebe a pensão alimentícia) para obtenção de informações acerca da destinação da pensão paga mensalmente. O Código Civil dispõe que a guarda unilateral obriga o pai ou a mãe que não a detenha a supervisionar os interesses dos filhos, e, para possibilitar tal supervisão, qualquer dos genitores sempre será parte legítima para solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seus filhos. Veja, portanto, que o objetivo da norma consiste em assegurar a obtenção de informações e/ou prestação de contas sobre o destino da verba prestada mensalmente por quem não detém a guarda do alimentado. Desse modo, não se pode negar ao alimentante não-guardião o direito de averiguar se os valores que paga a título de pensão alimentícia estão sendo realmente dirigidos ao beneficiário e voltados ao pagamento de suas despesas e ao atendimento dos seus interesses básicos fundamentais, sob pena de se impedir o exercício pleno do poder familiar. Não se trata de apenas interesse jurídico, mas também de um dever legal do genitor alimentante de acompanhar os gastos com o filho alimentado que não se encontra sob a sua guarda, fiscalizando o atendimento integral de suas necessidades, materiais e imateriais, essenciais ao seu desenvolvimento físico e psicológico, aferindo o real destino do emprego da verba alimentar que paga mensalmente. Com isso, é possível ver como esse dinheiro está sendo aplicado para atender as necessidades do filho. Ou seja, não justifica a propositura de ação dessa natureza para o eventual acertamento de contas, perseguições, provocações ou picuinhas com o guardião, devendo ela ser dosada (frise-se: a finalidade deve ser a obtenção de informações sobre a destinação da pensão paga mensalmente), ficando vedada a possibilidade de apuração de créditos, pois os alimentos são irrepetíveis, ou seja, é impossível juridicamente a restituição, caso sejam considerados indevidos. Em suma, o STJ firmou entendimento no sentido de que a pessoa (alimentante) pode ajuizar a ação de exigir contas em desfavor do guardião, mas não com o objetivo de obter o reconhecimento de eventual crédito. Mesmo que fique demonstrado que a mãe/pai não estava empregando todo o dinheiro para o filho, isso não gerará um crédito em favor do pai/mãe. Isso porque o objetivo é resguardar os interesses do alimentando, corrigindo os rumos, dali por diante, caso ele esteja sendo desassistido.

Como Fica a Prisão do Devedor de Pensão Alimentícia Durante a Pandemia?

A pandemia decorrente da Covid-19 levou a adoção de uma série de medidas de isolamento social na tentativa de conter a transmissão da doença. Uma das preocupações do governo era com a transmissão da doença entre as pessoas enclausuradas em estabelecimentos prisionais. Dadas a superlotação e as condições insalubres, é provável que não exista um local onde se tenha maior probabilidade de contágio da Covid-19 do que as unidades prisionais. Nesse sentido, os operadores do direito iniciaram discussões para definir sobre as prisões decorrentes de atraso no pagamento da pensão alimentícia: poderiam continuar sendo decretadas ou, diante do risco à saúde pública, seria mais adequado suspendê-las durante os efeitos da pandemia? Pois bem, ante a divergência de entendimentos dentro do próprio Superior Tribunal de Justiça, adveio a Lei n.º 14.010/2020 dispondo em seu artigo 15 que até o próximo dia 30 de outubro de 2020, a prisão civil por dívida alimentícia deverá ser cumprida exclusivamente sob a modalidade domiciliar, sem prejuízo da exigibilidade das respectivas obrigações. Ou seja, as prisões decorrentes do não pagamento de pensão alimentícia não estão suspensas. Continuam a ser decretadas, sendo imposto ao devedor de alimentos a prisão em regime domiciliar. Outra questão importante é que a decretação da prisão não livra o devedor de pagar a dívida alimentícia em atraso. Sobre a exoneração do devedor ao pagamento de alimentos atrasados, inclusive, cabe mencionar o entendimento fixado pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.529.532/DF) no sentido de que o credor alimentício pode renunciar aos alimentos pretéritos devidos e não prestados. Veja, via de regra o direito aos alimentos é irrenunciável. Ou seja, não pode aquele que tem direito aos alimentos abrir mão de recebê-los no presente e futuramente, por expressa vedação do artigo 1.707 do Código Civil. Contudo essa proibição de renúncia não se aplica para as prestações vencidas e não pagas, podendo assim, o credor deixar de cobrar as prestações vencidas mesmo que já estejam em fase executiva (cobrança judicial) ou ainda firmar um acordo reduzindo os valores devidos. Não se pode deixar de registrar que, especialmente no âmbito do Direito de Família, é saudável o estímulo à autonomia das partes para a realização de acordos, como ferramenta para se alcançar o equilíbrio e a manutenção dos vínculos afetivos.

Defesa do Grupo Econômico Em Execução Fiscal

A busca pela efetividade da cobrança judicial dos créditos tributários em execução fiscal pode resultar na invasão do patrimônio de pessoas físicas e jurídicas não diretamente relacionadas com a empresa devedora. Essa cobrança é feita em juízo através da execução fiscal, procedimento com regras próprias e que tem o objetivo de cobrar os créditos de titularidade das Fazendas Públicas e suas autarquias. Dessa forma, a Fazenda Pública, que pode ser a União, o Estado ou o Município, inicia a cobrança judicial de um tributo, por exemplo, baseada no título denominado Certidão de Dívida Ativa – CDA. A CDA, por sua vez, deve descrever detalhes do débito, como valor, origem e nome do devedor e responsáveis. É, exatamente, no apontamento do devedor e responsáveis o nascedouro de questões que podem gerar muita preocupação. Muitas vezes, mesmo que não conste na CDA, inclui-se na execução fiscal como devedores os sócios da empresa e, até mesmo, outras pessoas físicas e jurídicas, sob a alegação de que todos pertencem a um mesmo grupo econômico. Nesses casos, é necessário que a pessoa apontada como responsável, seja física ou jurídica, exerça sua defesa para que não veja seu patrimônio envolvido no pagamento de débitos de terceiros. Há situações em que a pessoa ou empresa incluída indevidamente na execução fiscal pode sofrer a invasão de seu patrimônio, inclusive de um bloqueio de suas contas correntes. A análise de caso a caso é necessária, pois, muitas vezes, a constrição foi lançada de forma indevida. Há mecanismos de defesa e entendimento consolidado pelos tribunais superiores que garantem a essa pessoa ou empresa a defesa de seu direito e patrimônio. A responsabilidade de terceiros sobre o crédito tributário só pode ocorrer em situações determinadas pelo Código Tributário Nacional, tais como o exercício da administração, seja pelo sócio gerente ou por um diretor, mediante a prática de atos com excesso de poderes ou infração de lei, contrato social ou estatutos. Portanto, se não houver a prova de uma das situações previstas em lei, não poderá ser atribuída a responsabilidade pelo débito. Além disso, a simples alegação de grupo econômico não é suficiente para exigir de uma empresa o pagamento do débito de outra. Grupo econômico pode existir, o que a lei não admite é a utilização fraudulenta de pessoas jurídicas e a fraude deve ser provada, além de alegada. Há casos em que uma terceira empresa é incluída como devedora na execução fiscal e sofre a constrição de seus bens, o que pode inviabilizar o negócio. O Superior Tribunal de Justiça já decidiu no sentido de que, quando há suspeita de utilização fraudulenta de empresas de um mesmo grupo econômico, deve ser garantida a defesa da empresa antes de qualquer medida constritiva de bens. Nesse caso específico, a inclusão de devedores que não constavam da CDA original mediante a alegação de abuso de personalidade jurídica em grupo econômico somente será admitida quando for provado o desvio de finalidade ou a confusão patrimonial. As pessoas envolvidas em cobranças dessa natureza devem estar atentas e buscar o seu direito à defesa, pois essa é uma garantia constitucional que não pode ser desprezada. Ninguém pode ser privado de seus bens sem o devido processo legal. A ampla defesa é garantida a todos, na forma mais adequada à particularidade de cada caso. Todo excesso deve ser reprimido, inclusive aquele comumente praticado pela Fazenda Pública.

Inconstitucionalidade de Bloqueios de Valores em Contas do Poder Executivo

O Estado do Espírito Santo firmou parceria com determinada OSCIP, visando melhorar o atendimento dos hospitais ao público e, na mesma toada, contratou um instituto para fazer a gestão compartilhada de serviços de saúde do sistema prisional e, ainda, uma associação para gerenciamento e execução de atividades e serviços de saúde no Hospital Estadual de Urgência e Emergência, com verba originada do Fundo Estadual de Saúde (FES). A OSCIP e o instituto foram processados na Justiça do Trabalho e esta, através de diversos Tribunais Regionais do Trabalho (TRT’s), bloqueou, arrestou, penhorou, sequestrou e liberou valores nas contas sob administração do Poder Executivo, para o fim de garantir as satisfações dos débitos advindos das reclamações trabalhistas, sem, contudo, levar em consideração que aqueles valores tinham uma finalidade específica, que residia na execução de contratos públicos, nos termos resumidamente assinalados acima. Então, antes que aqueles recursos saíssem da conta do Estado e fossem para as contas da OSCIP e do instituto, foram retirados pela Justiça do Trabalho, através do sistema BacenJud, ou seja, verba do FES, com finalidade determinada para a saúde pública, foi, a rigor, desviada. Na arena judicial o Estado sustentou não só a exposição acima, mas também que ditos bloqueios de valores acarretaria na deficiência dos serviços que lhe estavam sendo prestados em favor da população, entretanto, não restou-lhe outra alternativa que não fosse se socorrer da Corte Constitucional do Brasil (STF), visto que o Judiciário trabalhista havia, realmente, porém com todas as venias àquela Justiça Especializada, violado os artigos 1º. e 18º. (princípio do pacto federativo), 2º. (princípio da independência dos poderes), 84, inciso II (competência do chefe do Poder Executivo) e 167, incisos VI e X (princípios e regras do sistema orçamentário), todos da Constituição Federal. A ferramenta processual que o Governador do Estado do Espírito Santo utilizou para desafiar uma decisão do Supremo Tribunal Federal, foi a Arguição de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF), o que fez sob o amparo do artigo 102, parágrafo primeiro, da Constituição Federal, e artigo 1º. e seguintes da Lei 9.882/99, que dispõe sobre a ADPF, onde, aliás, conteve pedido de medida liminar. A referida ADPF foi tombada sob o número 664 e foi distribuída para a relatoria do Ministro Alexandre de Moraes, que ao apreciar o pedido liminar, considerou a plausibilidade da medida e os riscos sociais e individuais das várias ordens emanadas de diversos TRT’s, sobretudo por ter entendido, de antemão, a relevância dos fundamentos que calçaram a via judicial eleita pelo Governador do Estado do Espírito Santo, bem como o perigo da demora para entregar a tutela jurisdicional, ainda que provisória, tendo em vista que a situação com a qual se deparou colocava em cheque a atividade econômica e social do Estado. Interpretou-se, também, que por meio de suas finanças, o Estado destina uma série de direitos fundamentais previstos na CF à sociedade, inclusive o direito à saúde, não sendo crível, portanto, o desvio da verba do Poder Executivo, pelo Poder Judiciário, pois assim sendo, estar-se-ia impedindo a escorreita aplicação do dinheiro público, o que provavelmente comprometeria a eficiência da administração pública estadual na prestação de serviços essenciais à população, hipótese esta inaceitável a qualquer tempo, quanto mais agora, neste momento de pandemia. Em sua decisão monocrática que deferiu o pedido liminar contido na ADPF 664, posteriormente referendada pelo Pleno do STF, em 22/09/2020, o Ministro Alexandre de Moraes asseverou que a constrição judicial de receita pública é medida de excepcionalidade, permitida apenas para pagamentos de dívidas com o sistema de precatórios, aplicando-se o disposto no artigo 100, parágrafo sexto, da CF, e suspendeu “a eficácia das decisões judiciais que determinaram a constrição de verbas públicas oriundas do Fundo Estadual de Saúde em contas vinculadas a contratos de gestão ou termos de parceria para a execução de ações de saúde pública, até o julgamento de mérito” da arguição sob comento, ou seja, toda a quantia retirada pelo sistema BacenJud, da Justiça do Trabalho dos diversos TRT’s, deverão, por ordem do STF, retornar aos cofres do Estado do Espírito Santo, nas contas de onde saíram, assim como, no mínimo até ulterior deliberação, os TRT’s deverão se abster de fazer bloqueios, arrestos, penhoras, sequestros e liberações de valores que estiverem nas contas sob a administração do Poder Executivo do Estado do Espírito Santo. Embora a decisão exarada dos autos da ADPF 664 seja tecnicamente provisória, espera-se que no mérito seja mantida, tendo em vista a serenidade e razoabilidade dos fundamentos ali lançados.

Empresa em Recuperação Judicial Pode Participar de Licitação?

Saber se a empresa em recuperação judicial pode ou não participar de licitações públicas é matéria das mais controvertidas no Brasil, porque encontra opinião dividida dentro da doutrina especializada, como também na mentalidade dos juízes que decidem os casos concretos respectivos. A corrente que defende a ideia negativa, de que a empresa em recuperação não pode participar de processo licitatório lida com duas premissas, sendo uma mais específica, e outra mais abrangente e genérica. A primeira, a mais específica, é a de que a empresa em recuperação judicial não teria condições de satisfazer o requisito da qualificação econômica e financeira para concorrer com outras empresas no processo licitatório, e a segunda, mais abrangente e genérica, diz que todas as empresas, para participarem dos processos licitatórios, devem fazer prova – certidão negativa – de que não estão em recuperação judicial. No campo processual existe grande quantidade de decisões atreladas a esta corrente, a maior parte delas vinculadas à Lei nº 8.666/1993, responsável por regular as licitações e os contratos com a Administração Pública no país, citando como embasamento os artigos 27, inciso III, e 31, inciso II. Mas, com respeito a quem pensa diferente, ousa-se discordar em número e grau desta corrente, visto que ela não nos parece refletir a realidade prática e jurídica que origina, alimenta e impulsiona a recuperação judicial nos dias de hoje. Em primeiro lugar, a recuperação judicial não deve ser encampada com preconceito. A empresa que atravessa uma recuperação judicial não é empresa falida – embora não exista demérito na falência. A empresa sob recuperação deve deter viabilidade econômica – algo que precisa ser provado e reconhecido pelo juiz – está em busca da tutela protetiva do Estado para sair do problema consistente na deficiência de caixa. O problema de caixa das empresas é, infelizmente, algo corriqueiro em países de grande oscilação econômica, financeira e de mercado como o Brasil, e que mesmo assim mantém uma das mais altas e insustentáveis cargas tributárias do planeta, um verdadeiro paradoxo, diga-se de passagem. Em segundo lugar, a exigência da certidão negativa de recuperação judicial não pode ser levada às últimas consequências, haja vista que não é o que se traduz de qualquer legislação atualmente em vigor, pois, o que deve definir a participação ou não da empresa em recuperação judicial em processo licitatório é a sua capacidade econômica. Esta é a corrente mais acertada e evoluída sobre a matéria, com a qual nos afinamos, e tem ganhado cada vez mais espaço no Poder Judiciário brasileiro, especialmente através dos seus órgãos de cúpula, como o Superior Tribunal de Justiça, ocorrendo o mesmo dentro da Administração Pública, porque a Advocacia Geral da União que representa o Governo Federal em cenário judicial e extrajudicial, já emitiu parecer com este entendimento. Conclui-se, então, ser plenamente possível à empresa em recuperação judicial participar de processo licitatório, desde que na fase própria, que é a de habilitação, evidencie a sua capacidade econômica.