Reforma Tributária

A reforma tributária apresentada pelo governo no Projeto de Lei (PL) 2337/2021 prevê mudanças na incidência do imposto de renda, entre outros pontos. Tal proposta causou grande perplexidade aos economistas e juristas, além dos empresários e investidores, pois as projeções feitas concluíram que as medidas previstas resultarão em sensível aumento da carga tributária e complexidade do sistema. Dentre a modificações trazidas pela proposta original está a incidência do imposto de renda sobre os lucros e dividendos distribuídos aos sócios  e acionistas sob a alíquota de 20%, além da tributação corporativa das atividades da pessoa jurídica, que passa a ser de, aproximadamente, 21,5% para empresas tributadas pelo lucro real, e 19,53% para empresas do lucro presumido. A aplicação das alíquotas acima resultará no aumento da carga tributária do lucro para mais de 40%, cujo reflexo será suportado pelo empreendedor e pelo investidor. A previsão do exacerbado aumento da tributação no momento em que a economia reclama medidas que impulsionem a retomada econômica gerou indignação nos diversos setores produtivos e a manifestação de diversas entidades representativas contra a proposta. Apesar das justificativas apresentadas pelo governo, o fim da isenção dos dividendos, que vigorou por décadas, tem o efeito de afastar os investimentos, provocar a retirada do capital estrangeiro, diminuir a criação de emprego e renda e aumentar a informalidade. Embora uma das razões seja igualar o Brasil a outros países que já tributam os lucros e dividendos, deve-se considerar que tais países buscam equilibrar a carga tributária entre a pessoa jurídica e seus sócios aplicando alíquotas compatíveis com esse objetivo. Há países em que o lucro corporativo não é tributado e  outros em que não se tributa o lucro distribuído entre os sócios, como é o caso do Brasil nos últimos 25 anos. Mas esse não é o caso da proposta apresentada. Principalmente o setor de serviços, como médicos, engenheiros, arquitetos e advogados, que exercem  seu trabalho através de pessoas jurídicas, serão fortemente atingidos. A insurgência contra reforma tributária foi tamanha que o Ministro da Economia admitiu a modificação de alguns pontos. Por exemplo, no âmbito das microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional não incidirá imposto de renda sobre os lucros distribuídos aos sócios. A modificação do texto original do PL 2337/2021 já está definida para retirar o limite de R$ 20.000,00 para a isenção do imposto. Está em negociação a redução da alíquota do imposto de renda quando a distribuição do lucro quando a empresa for tributada pelo lucro presumido. Apesar de necessárias, tais modificações não são suficientes para evitar a extrema oneração do setor produtivo. A impressão que se tem é que forma inócuas as discussões travadas em torno da reforma tributária nos últimos anos, em que foi pontuada a necessidade de simplificação do sistema, da promoção da segurança jurídica e, sobretudo, a repulsa ao aumento da carga tributária. A proposta em discussão no Congresso Nacional não contempla nenhum desses anseios ou qualquer outro que promova a almejada justiça fiscal.Enfim, o momento é crucial para todos, trabalhadores, empreendedores, investidores e o próprio governo, pois a reforma tributária terá grande impacto na retomada da economia. Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/30/reforma-tributaria/

Indenizações Por Prisões e Condenações Injustas

Qualquer pessoa está sujeita a errar, já que todos somos falíveis. Um erro, porém, pode causar prejuízos a outras pessoas, o que obriga o infrator a reparar o dano que tiver sido causado pelo erro. E quando esse erro é praticado por um juiz ao decretar uma prisão injusta ou condenar um inocente, naquilo que é chamado de erro judiciário, o que acontece?  – Pessoa presa injustamente pode receber indenização do Estado?  É importante destacar que, ao determinar a prisão de determinado sujeito, o Estado deve ter todos os indícios previstos em lei para que tal encarceramento definitivamente aconteça, ou seja, o Estado, através de seus agentes públicos, deve possuir indicativos que justifiquem o aprisionamento do indivíduo. Desse modo, quando o Estado não possui os elementos necessários para justificar a prisão do suposto criminoso e mesmo assim a faz; ou ainda, quando o Estado possui possíveis elementos, mas ao final do processo verifica-se que o indivíduo foi preso injustamente, nasce, então, o direito de indenização por parte do sujeito em face do Estado. – Quais são as leis que garantem o direito à indenização ao cidadão?  Segundo a Constituição Federal, em seu artigo 5º, inciso LXXV, o Estado indenizará o condenado por erro judiciário. Há ainda o artigo 954, inciso III do Código Civil, que considera ofensiva à liberdade pessoal, sujeito a perdas e danos, a prisão ilegal. Paralelamente, o artigo 653, parágrafo 2° do Código de Processo Penal, ao regular a revisão criminal, possibilita o direito à indenização se o erro ou a injustiça da condenação não for imputável ao sujeito que fora privado de sua liberdade. – Um juiz que decreta uma prisão ou condena alguém e depois isto se revela injusto, pode ser enquadrado na lei de abuso de autoridade?  Uma prisão somente pode levar ao abuso de autoridade, se o juiz a decreta em desconformidade com a lei, o é um conceito muito subjetivo e mais ligado à não observância de aspectos formais. A injustiça, contudo, normalmente se dá quando a pessoa é realmente inocente e jamais poderia sequer ter sido processada, mas isto não se traduz em abuso de autoridade, apesar de ter sido erro da autoridade policial, do Ministério Público ou juiz. – Suponha-se que, no curso do processo criminal, o juiz decrete a prisão preventiva do réu; contudo, ao final, este vem a ser absolvido por falta de provas. Seria cabível a indenização?  A absolvição por falta de provas não significa, na acepção jurídica do vocábulo, inocência do réu. Indica somente que não foi possível condenar o acusado ante a insuficiência de provas a conferir juízo de segurança indispensável à sanção criminal, o que não basta para se falar em direito à indenização. – Como fica a situação da pessoa execrada pela mídia por causa de uma prisão e depois esse cidadão vem a ser inocentado? Isto aconteceu com os ex-presidentes Lula e Michel Temer?  Em casos de maior repercussão, a simples menção ao nome ou a divulgação da imagem da pessoa, que depois é inocentada, gera o direito a reparação dos danos morais e materiais. Isto foi o que aconteceu com o ex-presidente Michel Temer, que chegou a ficar preso alguns dias. Já no caso do ex-presidente Lula, preso por período bem maior, ele não foi inocentado; as condenações dele foram anuladas por questões processuais, de caráter formal, e ele ainda será julgado novamente, se não forem prescritos os crimes. – E a família do inocente? Também pode ser indenizada?  Os danos morais são aqueles pagos por abalo psicológico da vítima, no caso o cidadão inocente, e seus familiares. Sendo assim, caso os familiares entendam que sofreram humilhação, vergonha, acreditando que o direito à honra e à intimidade das pessoas da família foram lesados, ocasionados por aquele que ofende, configuraria direito à indenização por danos morais e até patrimoniais, a depender do caso. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/29/indenizacoes-por-prisoes-e-condenacoes-injustas/

O Aumento do Fundo de Campanha e o Salário Mínimo

O Fundo Especial de Financiamento de Campanha (FEFC), popularmente conhecido como Fundo de Campanha, segundo se extrai da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) para 2022, poderá ser aumentado de R$ 2,03 bilhões em 2020, para R$ 5,3 bilhões, valor este que depende, ainda, da definição que será trazida pela Lei Orçamentária Anual (LOA), a ser votada pelo Congresso Nacional após o retorno do recesso. Irresignados com a aprovação, em 15/07/2021, da LDO para 2022, seis Deputados Federais e um Senador da República impetraram um Mandado de Segurança contra ato atribuído à Mesa Diretora do Congresso Nacional, ao Presidente da câmara dos Deputados e ao Presidente do Senado Federal. O inconformismo desses parlamentares decorre do fato de que a verba aprovada é quase o triplo da já elástica verba aprovada em 2018 e 2020. A fundamentação jurídica do Mandado de Segurança sob comento foi pautada na alegação de que a majoração não atendeu prazo razoável para discussão de questão de tanta relevância, tanto assim que segundo consta na inicial, mais de duas mil e seiscentas emendas parlamentares ao projeto teriam sido analisadas em apenas uma sessão, o que nos permite presumir, para dizer o mínimo, que a questão não foi tratada com o relevo que merece. Também irresignado, o Senador Álvaro Dias, solitariamente, impetrou Mandado de Segurança contra ato atribuído ao Presidente e ao Vice-Presidente da Mesa do Congresso Nacional e, preventivamente, ao Presidente da República, sob o fundamento de que a LDO careceu de analisar vários vetos presidenciais, o que contraria o Art. 66, parágrafo 6º, da Constituição Federal. Alegou-se também que foi vedado destaque automático de partes de texto substitutivo, requerido por líder de bancada, o que afronta o Art. 49, parágrafo 5º, do Regimento Comum do Congresso Nacional, o que, por corolário teria desrespeitado o Art. 166 da Carta Magna. Nos dois Mandados de Segurança a Ministra Rosa Weber, Vice-Presidente do Supremo Tribunal Federal, no exercício da Presidência, não apreciou os pedidos liminares de plano, o primeiro com a pretensão de anular as votações que aprovaram a LDO-2022 e que quando houver novas votações, sejam proibidos aumentos do FEFC enquanto durar a pandemia, já foi sustentado que com R$ 5,7 bilhões dá para adquirir mais de 350 milhões de doses de vacinas. No segundo MS, buscou-se suspender a aprovação do projeto de lei do Congresso Nacional nº 3 de 2021-CN, liminarmente, e no mérito, pugnou-se pela nulidade da aprovação da LDO. Em ambos Mandados de Segurança a Ministra Rosa Weber determinou a notificação das autoridades impetradas, bem como a União, esta, para caso queira, ingresse na lide. Por fim, determinou que os dois processos sejam remetidos ao Ministro Nunes Marques, relator de ambos. Num momento de pandemia, ainda que mais amena neste momento, parece-me um escárnio a fixação de um valor em torno de R$ 5,7 bilhões para Fundo de Campanha, ao passo que com tal verba conseguiríamos acelerar a vacinação da população brasileira contra a Covid-19. O isolamento social que nos foi imposto pela pandemia que ainda estamos vivendo nos ensinou a nos comunicarmos e nos relacionarmos virtualmente. São reuniões, confraternizações, audiências judiciais, sessões solenes, entre outras, de forma on-line, que tem dado certo. Não é desarrazoado pensar em manter o Fundo de Campanha com o valor de 2018/2020 e direcionar a diferença para aprimorar o combate à pandemia, principalmente diante da expectativa do que poderá ser a variante Delta, cada dia mais próxima. E em meio a tudo isso, a LDO-2022 prevê que o atual salário mínimo de R$ 1.100,00 suba para R$ 1.147,00 em 2022 e para R$ 1.188,00 em 2023. Alguma coisa está errada! Rodrigo Carlos de Souza, sócio e fundador de Carlos de Souza Advogados, Secretário Geral Adjunto e Corregedor Geral da OAB/ES, Vice-Presidente da Comissão Nacional de Compliance Eleitoral e Partidário da OAB e Diretor do CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Seccional Espírito Santo). Letícia Stein Carlos de Souza, Acadêmica do 4º. Período da Faculdade de Direito de Vitória e Estagiária de Direito. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/28/o-aumento-do-fundo-de-campanha-e-o-salario-minimo/

Guarda Compartilhada para Pais que Moram em Cidades Diferentes

Imaginemos o seguinte caso: Ricardo e Soraya foram casados e tiveram uma filha, chamada Beatriz. Após o divórcio, Ricardo passou a morar no Rio de Janeiro-RJ e Soraya continuou vivendo em Vitória-ES. Assim, os pais da criança passaram a viver em cidades distintas e distantes entre si. Soraya requereu em juízo a guarda unilateral da criança, afirmando que a distância da residência do genitor inviabilizaria a guarda compartilhada, já que não seria possível a divisão equânime das responsabilidades. Por outro lado, Ricardo sustentou que a fixação da guarda compartilhada melhor atenderia aos interesses da filha, sendo que a residência em cidades distintas não impede a fixação de guarda compartilhada, devendo ser estabelecida mesmo sem consenso dos genitores. Pois bem, caso similar foi apreciado pelo Superior Tribunal de Justiça (REsp 1.878.041-SP, Rel. Min. Nancy Andrighi, julgado em 25/05/2021), que adotou o entendimento de que ainda que os genitores possuam domicílio em cidades diversas, por si só, não representa óbice à fixação de guarda compartilhada. Para entendermos melhor sobre o assunto, é importante esclarecer que a guarda consiste no dever de prestar assistência educacional, material e moral ao menor. Trata-se do exercício do poder familiar e de responsabilidades, direitos e deveres concernentes à criação da criança ou do adolescente. Apesar de existirem outras espécies de guarda (por exemplo: aninhamento e alternada, modalidades criadas pela doutrina), o Código Civil prevê expressamente as espécies: unilateral (exclusiva) e compartilhada (conjunta), sendo as mais comuns na prática. A guarda unilateral consiste quando um dos pais fica com a guarda e o outro possui apenas o direito de visitas ao filho, bem como o dever de supervisionar os interesses deste, podendo, inclusive, solicitar informações e/ou prestação de contas, objetivas ou subjetivas, em assuntos ou situações que direta ou indiretamente afetem a saúde física e psicológica e a educação de seu (s) filho (s). Por sua vez, a guarda compartilhada impõe a divisão de responsabilidades entre os pais e o exercício de direitos e deveres dos pais que não vivam sob o mesmo teto. Nesta espécie, apesar de ambos possuírem a guarda, é recomendável que se defina a base da residência do filho, garantindo-lhe uma referência de lar, rotina e relações da vida, bem como é imprescindível que seja equilibrado o tempo de convivência do filho com ambos genitores. Apesar de similar, a guarda compartilhada não pode ser confundida com a guarda alternada, que ocorre quando os pais se revezam em períodos exclusivos de guarda, ou seja, é aquela na qual durante alguns dias um genitor terá a guarda exclusiva e, em outros períodos, o outro genitor terá a guarda exclusiva. É importante consignar que esta modalidade não é recomendável e é altamente inconveniente, uma vez que pode trazer confusões psicológicas à criança, já que perde seu referencial ao receber tratamentos diversos quando na casa dos genitores. Feitos tais esclarecimentos, calha registrar que não havendo consenso entre os genitores, regra geral é a fixação da guarda compartilhada, salvo quando um dos pais não desejar a guarda do menor ou um destes não estiver apto a exercer o poder familiar. Isso porque, a guarda compartilhada é sem dúvidas a espécie mais benéfica. Voltando os olhos para a situação fática trazida, o fato de Ricardo morar no Rio de Janeiro-RJ e sua filha residir com a genitora em Vitória-ES, por si só, não impede a instituição da guarda compartilhada, permitindo que ambos pais exerçam a autoridade e compartilhem as responsabilidades referente aos filhos mesmo que à distância. Afinal, atualmente, com o avanço tecnológico, por meio de ferramentas digitais é possível o contato virtual instantâneo, favorecendo a comunicação não apenas entre os pais separados como também entre estes e seus filhos. Logo, é plenamente possível que, à distância, os pais compartilhem a responsabilidade sobre o (s) filho (s), participando ativamente das decisões atinentes à vida deste (s), contribuindo diretamente para a formação afetiva e cognitiva da criança. David Roque Dias, associado de Carlos de Souza Advogados, especializado em Direito Civil, Contratos e Assuntos Societários. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/27/guarda-compartilhada-para-pais-que-moram-em-cidades-diferentes/

Desconto no Salário do Empregado por Danos Causados

Na relação de trabalho, é corriqueiro que o empregador queira descontar do salário do empregado valores decorrentes de algum prejuízo que tenha causado no desempenhar de suas atividades laborais. No entanto, muitas dúvidas surgem quanto à legalidade de tais descontos. Em outras palavras, indaga-se: Quando realmente seria possível efetuar desconto em folha de pagamento? O artigo 462 § 1º da CLT é claro em dizer que o dano causado pelo empregado poderá ser descontado, desde que esta possibilidade tenha sido acordada ou se o fato causador do dano tenha ocorrido por dolo do empregado. Dolo é a intenção de causar um prejuízo. Percebam que o legislador definiu duas hipóteses para a realização de desconto. A primeira delas seria quando o desconto é acordado entre as partes, o que significa dizer que a possibilidade de desconto deve ser previamente ajustada no próprio contrato de trabalho ou termo aditivo, de modo que se torne inequívoco o “ajuste” entre o empregado e empregador, ou que os descontos estejam previstos em norma coletiva (Acordo Coletivo de Trabalho ou Convenção Coletiva de Trabalho). A segunda hipótese diz respeito ao dano causado com dolo pelo empregado – com intenção de causar prejuízo -, não sendo necessária, neste caso, a existência previsão em contrato de trabalho ou instrumento coletivo. É importante ressaltar que na hipótese de dano causado pelo empregado com dolo, é imprescindível que o empregador tenha prova do dano e do dolo do empregado, pois, acaso não comprovados, em caso de eventual ação trabalhista, a empresa poderá vir a ser condenada a devolver os valores descontados do salário do empregado. Ainda que haja previsão em contrato de trabalho, considera-se prudente que haja comprovação também nas hipóteses de culpa do empregado, ou seja, ainda que não se trate da hipótese de dolo do empregado, é importante que o empregador também comprove que o dano tenha sido causado pelo empregado em razão de negligência, imprudência ou imperícia. O Tribunal Superior do Trabalho tem se posicionado no sentido de que é indispensável a comprovação pelo empregador, para efeito de descontos por danos causados pelo empregado, da culpa ou dolo do empregado, mesmo que haja expressa previsão de descontos por danos em contrato de trabalho ou instrumento coletivo de trabalho, sob pena de se transferir ao empregado os riscos da atividade empresarial, o que ocorre, por exemplo, em relação ao empregado que necessita utilizar veículo de empresa para realização de suas atividades laborais (0000897-09.2013.5.09.0095). Assim, é importante que o empregador, antes de efetuar descontos nos salários do empregado a título de ressarcimento por danos causados, além da prova da culpa ou dolo, bem como do próprio dano, também avalie se o dano não decorreu de risco inerente à própria atividade empresarial. Utilizando-se o exemplo de um motorista de transporte interestadual, por exemplo, em razão da necessidade de deslocamentos em estradas muitas vezes perigosas, o empregado é exposto ao risco acentuado de eventual acidente com o veículo ou quebra de alguma peça, pelo que a realização de descontos sem a comprovação da culpa do empregado, caracterizará a existência de desconto ilegal, na medida em que se transfere ao empregado o risco da atividade do empregado. Rodrigo Silva Mello e Roberta Conti R. Caliman, sócios de Carlos de Souza Advogados, são especializados em Direito Trabalhista. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/26/desconto-no-salario-do-empregado-por-danos-causados/

Justiça Autoriza Créditos de PIS e COFINS Referentes à Implantação da LGPD

Em recente decisão judicial da 4ª Vara Federal de Campo Grande – MS, a rede de lojas TNG obteve o direito de utilizar créditos de PIS e COFINS sobre gastos relativos à implementação e manutenção de programas para gerenciamento de dados para a adequação à Lei Geral de Proteção de Dados (LGPD). O PIS e a COFINS são tributos previstos na Constituição Federal, sendo o PIS o Programa de Integração Social e a COFINS a Contribuição para Financiamento da Seguridade Social. Ambos estão sujeitos à não-cumulatividade, sistemática que permite o aproveitamento de créditos sobre insumos pelo contribuinte na apuração das contribuições. Observe-se que a Lei 10.637/2002 prevê a possibilidade de desconto de créditos relativos a bens e serviços usados como insumos da base de cálculo do PIS, enquanto a Lei 10.833/2003 tem previsão semelhante com relação à COFINS. Como os gastos realizados para adequação à nova legislação de tratamento de dados são essenciais para a atividade-fim da empresa, tendo em vista a série de obrigações impostas pela LGPD, devem ser considerados como insumos. Nesse sentido foi o entendimento do Superior Tribunal de Justiça (STJ) quando definiu que insumo são bens ou serviços que sejam relevantes ou essenciais à produção, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância para a atividade econômica. Da mesma forma, o juiz afirmou na decisão que “o tratamento dos dados pessoais não fica a critério do comerciante, devendo então os custos respectivos serem reputados como necessários, imprescindíveis ao alcance dos objetivos comerciais”. Verificados os critérios de essencialidade e relevância, considerando-se sua imprescindibilidade e importância para o desenvolvimento da atividade social, torna-se possível que as empresas tenham direito a créditos das contribuições sociais pelos gastos de imposição legislativa advindas da LGPD. A decisão deixa um precedente bastante positivo para as empresas que atualmente se movimentam para estar de acordo com os mandamentos legais da LGPD, haja vista que pequenas e médias empresas possuem investimento médio entre 50 mil e 800 mil reais por ano para cumprir tais exigências. Pedro Victor Gomes de Lima, acadêmico do 10º. Período da Faculdade de Direito de Vitória e Estagiário de Direito. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/23/justica-autoriza-creditos-de-pis-e-cofins-referentes-a-implantacao-da-lgpd/

A Punição Por Maus-Tratos Aos Animais

Caracterização dos maus-tratos: É fundamental saber o que a legislação brasileira lista e qualifica como práticas de maus-tratos aos animais: atos gerais de abuso ou crueldade; manter os animais em lugares anti-higiênicos; obrigá-los a trabalhos excessivos; golpear, ferir ou mutilar os animais domésticos; abandonar animal doente, ferido, extenuado ou mutilado; promover lutas entre animais da mesma espécie. Proteção dada pela Constituição Federal: A Constituição Federal dá um tratamento protetivo especial ao meio ambiente como um todo, incluindo a fauna. Pelo texto constitucional, há vedação expressa à crueldade contra animais. Há, contudo, exceção no uso de animais para práticas desportivas que sejam manifestações culturais. O grande problema nessa exceção é a ausência de um limite claro do ultrapassaria o uso cultural da crueldade contra o animal. Há muitas décadas tenta-se, infelizmente ainda sem sucesso, acabar com eventos como “vaquejadas” e “farras do boi”, que trazem evidentes maus-tratos aos animais. O Supremo Tribunal Federal ainda não decidiu definitivamente essa questão, cujo julgamento começou em novembro do ano passado, mas está suspenso por pedido de vista. Penalidades criminais: Desde 1998 foi instituída uma lei que aumentou as penas por maus-tratos aos animais, mas ainda de forma insuficiente. Segundo essa lei, o infrator pode pegar de três meses a um ano de detenção (ou seja, não irá para a cadeia!), se praticar maus-tratos, ferir ou mutilar animais silvestres, domésticos ou domesticados, nativos ou exóticos, bem realizar experiência dolorosa ou cruel em animal vivo, ainda que para fins didáticos ou científicos, quando existirem recursos alternativos. Um novo ânimo protetivo, porém, se deu agora em 2020, com uma chance de condenação bem maior para a hipótese de maus-tratos contra cães e gatos, com penas que podem chegar a cinco anos de prisão. Prisão em flagrante e fiança: No caso de prisão em flagrante por maus-tratos a cães ou gatos, não é mais possível que o infrator pague uma fiança arbitrada pelo delegado e já seja liberado. Considerando o aumento das penas criminais, a pessoa presa em flagrante será recolhida ao presídio e terá que, a partir do dia seguinte, ir a uma audiência de custódia perante um juiz, que poderá ou não arbitrar uma fiança e deixar que se responda ao processo em liberdade. A decisão do juiz levará em conta possível reincidência, gravidade e repercussão do caso. Críticas ao aumento das penas: Uma das críticas mais contundentes à Lei 14.064/2020, que elevou as penas por maus-tratos a cães e gatos, se dá pelo fato de essas penas serem maiores do que a de alguns crimes contra as pessoas, como lesão corporal, que vai de três meses a um ano de detenção, por exemplo. Tatuagens e piercings em animais: Essa prática, a meu ver totalmente reprovável, vem ganhando adeptos mundo afora. Donos de animais têm decidido “enfeitar” os seus animais de estimação, não existindo, ainda, uma lei brasileira que proíba a prática. Qualquer pessoa, para se tatuar ou colocar um piercing, o faz com a sua própria autorização; no caso de menores de dezoito anos, ainda é necessária a autorização dos pais. É covardia, no entanto, submeter um animal doméstico a uma prática contra a qual (obviamente!) ele não pode opinar. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/22/a-punicao-por-maus-tratos-aos-animais/

A Empresa Pode Proibir Relacionamento Amoroso Entre Empregados?

Não é novidade para nós que relacionamentos interpessoais dentro do ambiente de trabalho, em algumas situações, podem despertar sentimentos amorosos entre colegas de trabalho. Mas esta relação de namoro, dentro do ambiente de trabalho, gera bastante controvérsia, por diversos aspectos, dentre os quais, pode ser citado eventual queda da qualidade do serviço ou produtividade, o que faz com que muitos empregadores, ainda hoje, estabeleçam políticas internas no sentido de proibir relacionamento amoroso entre colegas de trabalho. Evidente que há situações em que o relacionamento entre empregados enamorados ultrapassam o limite do bom senso, e, muitas vezes, esquecendo-se que estão no ambiente corporativo, discutem ou mesmo se excedem no afeto mútuo, o que pode gerar inegável constrangimentos aos colegas, comprometendo rendimento no trabalho e o bom andamento das tarefas diárias, porém, tais fatos não autorizam a proibição pelo empregador. Diversas são as decisões proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho no sentido de considerar discriminatória a proibição de namoro através de normas institucionais da empresa, por ferir princípios constitucionais da dignidade do trabalhador, à intimidade, dentre outros. Em tais casos, as empresas normalmente são condenadas no pagamento de indenizações por danos morais pela prática de assédio moral, como ocorreu, por exemplo, nos autos do processo nº 0001101-12.2016.5.20.0008, em que o TRT da 20ª Região, considerou que a proibição de namoro constante na política interna da empresa, feriu os direitos da personalidade do trabalho. Mas o que o empregador pode fazer já que não pode proibir namoro? Com o objetivo de evitar excessos, é importante que o empregador crie regras claras, baseadas no bom senso, para que o trabalhador não seja “pego de surpresa”, ao ser advertido, no sentido de dizer que não sabia da existência de determinada regra. Mas o que fazer nos casos em que houver excessos por parte dos namorados? Apenas nesta situação é que os empregados poderão ser punidos, lembrando que deve ser conferida privacidade na conversa do empregador com o casal, devendo ressaltar que a empresa em nenhum momento é contra o relacionamento, no entanto, não devem se exceder nas manifestações amorosas no ambiente de trabalho. O comportamento do casal frente ao empregador deve ser sempre muito transparente, no sentido de não esconder a existência de um relacionamento amoroso, devendo sempre se atentarem para não trazerem problemas/discussões de ordem pessoal para o trabalho, evitando demonstrações públicas e exageradas de afeto, ou seja, o bom senso sempre deve prevalecer. Por fim, importante deixar claro que comportamentos desrespeitosos, se provados, não serão amparados pela Justiça do Trabalho, e, dependendo da gravidade, poderão ensejar até mesmo a dispensa por justa causa dos empregados envolvidos. Rodrigo Silva Mello e Roberta Conti R. Caliman, sócios de Carlos de Souza Advogados, são especializados em Direito Trabalhista. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/21/a-empresa-pode-proibir-relacionamento-amoroso-entre-empregados-2/

Quem é Responsável Pelo Pagamento Perante o Condomínio: o Proprietário Registrado no Cartório ou o Comprador Que Ainda Não Registrou a Propriedade?

A pessoa comprou um imóvel de outra, que é o vendedor; pagou o preço integralmente, mas ainda não transferiu a propriedade no registro de imóveis, seja porque não possui condições financeiras para arcar com as despesas, seja por comodidade. Ocorre que o vendedor, anos depois da venda, recebe a citação para responder perante o condomínio por débitos acumulados após a venda. Ora, quem é parte legítima para responder pelo débito se o compromisso de compra e venda nem sequer foi registrado? A situação é mais comum do que se imagina, e por serem muitos os processos que abordam o tema, o Superior Tribunal de Justiça (STJ) pacificou a questão com o julgamento de um recurso em que o Condomínio tentava receber o que lhe era devido. Conforme o entendimento do STJ, o que determina a responsabilidade pelo pagamento das obrigações perante o condomínio (cotas condominiais, taxas extras e tudo que se refere ao imóvel) não é o registro do compromisso de compra e venda, mas a relação jurídica material com o imóvel, que é aferida pela imissão na posse pelo promissário comprador e pela ciência inequívoca do condomínio sobre a transação de compra e venda realizada. Assim, havendo compromisso de compra e venda não levado a registro, a responsabilidade pelas despesas de condomínio pode recair tanto sobre o promitente vendedor (que permanece figurando como proprietário no cartório de registro de imóveis) quanto sobre o promissário comprador (que apesar de ter pago integralmente o preço ainda não registrou o ato). Tudo vai depender das circunstâncias de cada caso concreto! Se ficar comprovado: (i) que o promissário comprador se imitiu na posse; e (ii) o condomínio teve ciência inequívoca da transação, afasta-se a legitimidade passiva do promitente vendedor para responder por despesas condominiais relativas a período em que a posse foi exercida pelo promissário comprador. Mas o que seria essa “ciência inequívoca”? Ora, quem participa das assembleias condominiais, assina as atas, recebe e-mails com informações, conversa com o síndico, recebe as correspondências, ou, ainda que aluga a unidade, e se apresenta como locador, é quem deve responder pelo pagamento de débitos perante o condomínio. Portanto, a situação de fato é que determina o responsável pelo pagamento de débitos condominiais, sendo indiferente se o compromisso de compra e venda foi ou não registrado. O ideal, portanto, é que o compromisso de compra e venda seja formalizado mediante contrato escrito e registrada no cartório competente, o que visa à proteção de todos os envolvidos, podendo, até mesmo, postergar-se, mas não tanto, o registro efetivo da escritura de compra e venda quando a situação financeira se mostrar favorável. Chrisciana Oliveira Mello, sócia de Carlos de Souza Advogados, aluna especial do curso de mestrado em Processo Civil da Universidade Federal do Espírito Santo. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/20/quem-e-responsavel-pelo-pagamento-perante-o-condominio-o-proprietario-registrado-no-cartorio-ou-o-comprador-que-ainda-nao-registrou-a-propriedade/

É Possível Realizar a Comunicação de Dispensa do Empregado Por Whatsapp?

A utilização de aplicativos de mensagens é uma realidade cada vez mais presente entre os brasileiros, que acabou por ser potencializada em razão da pandemia do Coronavírus (Covid-19), não sendo diferente também nas relações de trabalho. Uma decisão do Tribunal Superior do Trabalho (TST) proferida no final do mês de maio/2021, contudo, acalorou os debates acerca da possibilidade de se validar a dispensa sem justa causa de empregado através de comunicação feita por aplicativos de mensagens. A 6ª Turma do TST manteve a condenação de um empregador doméstico no pagamento de indenização por danos morais, no valor de R$ 2.400,00, pela dispensa havida através de uma mensagem enviada por seu empregador com os seguintes dizeres: “Bom dia. Você está demitida. Devolva as chaves e o cartão da​ minha casa. Receberá contato em breve para assinar documentos”. A decisão recorrida foi proferida pelo Tribunal Regional do Trabalho da 15ª Região (TRT-15) que manteve a decisão de primeira instância, condenando o empregador no pagamento de indenização por danos morais, não em razão da dispensa ter sido comunicada através de meio eletrônico (Whatsapp), mas sim, pelo conteúdo da mensagem enviada pelo empregador que, de acordo com a sentença, “denota, no mínimo, falta de respeito à dignidade humana, não se justificando nem mesmo em nome dos avanços tecnológicos e de meios de comunicação virtuais”. Da decisão do TRT-15, o empregador recorreu ao TST visando a reforma da decisão destacando que a utilização de aplicativos de mensagens é meio válido de comunicação entre empregador e empregado, bem como que a comunicação não pode ser tida como ofensiva. Como mencionado, o TST manteve a decisão proferida pelo TRT-15, porém, sem analisar o mérito da legalidade da comunicação da dispensa por Whatsapp, em razão da necessidade de se avaliar o contexto das mensagens, o que seria vedado pelo ordenamento jurídico em razão da natureza extraordinária do Recurso de Revista, pelo que referida decisão, na verdade, não soluciona o questionamento acerca da validade ou não da dispensa feita através de meio eletrônico. No entanto, outra decisão proferida pelo TRT-2, validou dispensa de uma coordenadora pedagógica que havia sido feita através de mensagem de Whatsapp. Na ocasião, o TRT-2 entendeu que a utilização de aplicativos de mensagens é uma ferramenta de comunicação válida entre empregador e empregado, tendo se tornado “um grande aliado, especialmente no ano de 2020, em razão da pandemia”. Na verdade, não existe uma regra na norma celetista a respeito da forma com que a comunicação de dispensa deve ser realizada, contudo, sempre que possível, para se evitar qualquer tipo de discussão, é recomendável que seja feita de forma presencial, sendo certo que a validade da dispensa realizada através de aplicativo de mensagens será avaliado caso a caso pelo judiciário.  Deve-se, contudo, na hipótese de dispensa por meio eletrônico, ter o empregador o cuidado do texto, fazendo-o de forma bem elaborada e respeitosa. Rodrigo Silva Mello e Roberta Conti R. Caliman, sócios de Carlos de Souza Advogados, são especializados em Direito Trabalhista. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/07/19/e-possivel-realizar-a-comunicacao-de-dispensa-do-empregado-por-whatsapp/