As microempresas e empresas de pequeno porte optantes pelo Simples Nacional devem pagar o diferencial de alíquota do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) nas compras de mercadorias provenientes de outros Estados. Nesse sentido decidiu o Supremo Tribunal Federal (STF) no julgamento do Recurso Extraordinário (RE) 97082, em apertada votação. As empresas micro e pequenas empresas gozam de tratamento diferenciado e favorecido, nos termos estabelecidos na Constituição Federal, motivo pelo qual foi instituído pela Lei Complementar nº 123/2006 o regime de recolhimento dos tributos federais, estaduais e municipais de forma simplificada e unificada, com a aplicação de uma alíquota sobre o faturamento. O recolhimento é feito pela União e o resultado é partilhado entre União, Estados e Municípios. Tais empresas representam a maioria dos negócios em atividade no país e contribuem consideravelmente para a geração de empregos. Ou seja, a economia depende da saúde financeira desse setor, pois ele faz o dinheiro girar. Essas características, aliadas à limitação de faturamento e à necessidade de serem mais competitivas, justificam o tratamento desigual que é dispensado pelo Fisco à microempresas e empresas de pequeno porte. Dessa forma, a proteção constitucional deveria prevalecer sobre os interesses dos Estados na cobrança do diferencial de alíquota, pois as empresas do Simples Nacional não podem utilizar créditos de ICMS como fazem as empresas tributadas pelo lucro presumido ou lucro real. Na sistemática estabelecida, o diferencial de alíquota do ICMS pago ao Estado em que se situa a empresa não poderá ser creditado para quitação do imposto vincendo. Nesse ponto, a violação da não-cumulatividade do ICMS foi flagrantemente violada, em prejuízo das empresas optantes pelo Simples Nacional. Verdadeiramente, ao firmar a tese “É constitucional a imposição tributária de diferencial de alíquota do ICMS pelo estado de destino na entrada de mercadoria em seu território devido por sociedade empresária aderente ao Simples Nacional, independentemente da posição desta na cadeia produtiva ou da possibilidade de compensação dos créditos”, o STF afastou o tratamento favorecido e diferenciado que deveria ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte, nos termos estabelecidos pela Constituição Federal. Conclui-se que, para os contribuintes nega-se a possibilidade de fruição de outros benefícios quando ocorrer o pagamento dos tributos pelo regime simplificado, enquanto o Fisco é autorizado a utilizar regime híbrido para exigir, além do Simples Nacional, o diferencial de alíquota do ICMS na aquisição de mercadoria de outro Estado, sem permitir a utilização do crédito do imposto. Afastou-se, portanto, o tratamento favorecido e diferenciado que deveria ser dispensado às microempresas e empresas de pequeno porte, assim como o princípio da não-cumulatividade do ICMS, ambos escritos na Constituição Federal, mas afastados pelos interesses arrecadatórios. Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/05/21/empresas-do-simples-nacional-devem-pagar-o-difal-ao-estado-de-destino-das-mercadorias/
A pandemia tem trazido um novo tipo de conflito entre casais separados e com filhos: vez por outra, um dos dois entende que, devido aos riscos da contaminação, o outro não pode ter acesso ao filho. Vários são os argumentos, destacando-se como principais, (1) que este outro não está vacinado e/ou (2) que sai de casa, seja para o trabalho ou para socializar, e não toma os devidos cuidados. Os Tribunais brasileiros têm se pautado pela preservação da segurança do menor e muitas são as decisões impedindo que a criança tenha contato com o genitor que não seja aquele que habita em seu lar de referência. Aliás, esse tipo de entendimento tem prevalecido em relação ao contrário, ou seja, há entendimento jurisprudencial de que não poderia haver tal proibição, entretanto, o número de decisões neste sentido é bem menor, neste momento excepcional de pandemia. É dito neste momento porque o Direito é uma ciência mutante, que depende do sentimento do julgador, e isto pode ser que mude até num curto espaço de tempo. Uma decisão judicial que atenda esse tipo de pedido, de proibição de que um dos genitores visite o filho presencialmente, é muito extrema e fere a primazia da guarda compartilhada dos filhos e o direito de convivência entre genitor e filho. Na guarda compartilhada, o tempo de convívio com os filhos deve ser dividido de forma equilibrada com a mãe e com o pai, sempre tendo em vista as condições fáticas e os interesses dos filhos, sendo que a cidade considerada base de moradia dos filhos será aquela que melhor atender aos interesses dos filhos, quando pai e mãe morarem em cidades distintas. Decisões que impedem a visitação ou convivência de um genitor com o filho podem, ainda, ser consideradas uma interferência indevida do Judiciário no direito / dever que existe nessa convivência, uma vez que suspendem (sabe-se lá por quanto tempo…) o relacionamento afetivo que existe no relacionamento presencial e físico, de fato uma das melhores formas de expressão. De qualquer forma, justa ou injusta, o fato é que essa interferência judicial tem sido comum sob o argumento de que o direito à saúde da criança não pode ser desprezado, devendo o genitor impedido do convívio limitar-se a “visitas virtuais”. O que se vê, neste tipo de discussão e inclinação judicial, é que a vontade da criança, sempre tão prevalente nos casos de separação em que não há um acordo entre os pais quanto à guarda do filho, é relativizada com fundamento no fato de que a criança não tem como compreender e dimensionar os riscos causados pela pandemia. Há de se destacar que a avaliação dos potenciais riscos que um dos genitores pode representar à criança, por não respeitar devidamente as normas sanitárias, é algo extremamente subjetivo em certos aspectos e, se não adotados os devidos cuidados, pode se tornar injusto. Uma vez existente o perigo potencial, o genitor que busca a proteção judicial terá que provar, na Justiça, as atitudes e rotinas do outro que representem o risco. Esse tipo de prova pode se dar pelas mais diversas maneiras, inclusive postagens em redes sociais, conversas por meios eletrônicos e testemunhas. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado pelo Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/05/20/conflitos-nas-visitas-aos-filhos-em-tempos-de-pandemia/
O Código de Ética Médica (CEM) prevê que “a medicina é uma profissão a serviço da saúde do ser humano e da coletividade e será exercida sem discriminação de nenhuma natureza”. Estende-se isso para o médico e para seu paciente, guardando absoluto respeito pelo ser humano e atuando sempre em seu benefício. Vale destacar, também, a previsão de que “O médico exercerá sua profissão com autonomia, não sendo obrigado a prestar serviços que contrariem os ditames de sua consciência ou a quem não deseje, excetuadas as situações de ausência de outro médico, em caso de urgência ou emergência, ou quando sua recusa possa trazer danos à saúde do paciente.” Assim, o referido Código, acatando o pensamento mundial que rege a matéria, estabeleceu um canal de comunicação verdadeiro e ativo entre o médico e o paciente. É notório que o médico é dotado de conhecimento especializado sobre determinada área e sua palavra é de vital importância para a solução da moléstia apresentada, mas às pode não coincidir com a opinião do paciente, que opta por outro procedimento. O CEM também faz inserções pontuais nas diversas restrições à ação do médico, de interesse relevante para o tema abordado. Traz uma regulamentação destinada à proteção dos Direitos Humanos e estabelece que é vedado ao médico “deixar de obter consentimento do paciente ou de seu representante legal após esclarecê-lo sobre o procedimento a ser realizado, salvo em caso de risco iminente de morte” e “deixar de garantir ao paciente o exercício do direito de decidir livremente sobre sua pessoa ou seu bem-estar, bem como exercer sua autoridade para limitá-lo”. Ademais, é direito do médico indicar o procedimento adequado ao paciente, observadas as práticas cientificamente reconhecidas e respeitada a legislação vigente. Por outro lado, é vedado ao médico deixar de usar todos os meios disponíveis de promoção de saúde e de prevenção, diagnóstico e tratamento de doenças, cientificamente reconhecidos e a seu alcance, em favor do paciente. A autonomia do paciente também não pode ser esquecida, uma vez que sua vontade deve ser respeitada no tratamento, desde que adequada ao caso e cientificamente reconhecida e, sobretudo, quando não põe em jogo a sua vida. Nesse sentido foi o Parecer nº 4/2020, do CFM, que discorreu sobre o uso da cloroquina e hidroxicloroquina, em condições excepcionais, para o tratamento da COVID-19. No documento, o Conselho deixou claro que a decisão sobre o uso dos medicamentos fica a critério do médico assistente, em decisão compartilhada com o paciente, sendo ele obrigado a relatar ao doente que não existe, até o momento, nenhum trabalho que comprove o benefício do uso da droga para o tratamento da COVID-19, explicando os efeitos colaterais possíveis, e obtendo o consentimento livre e esclarecido do paciente ou dos familiares. Quando o paciente revela sua opção por um determinado tratamento, o médico deve, sempre que possível e adequado ao caso concreto, assegurar que a sua vontade será respeitada por ele ou por profissional substituto, nos casos de objeção de consciência. Humanização e respeito à autonomia do médico e do paciente – cada uma com seus limites, informação detalhada e registrada, bem como atualização científica do profissional – são os pilares de uma relação médico-paciente de sucesso, seja dentro ou fora do contexto atual de pandemia. Os riscos para o médico, quando esses princípios são observados, não desaparecem, mas também não assombram. É um direito e também um dever do médico prescrever o melhor tratamento, de acordo com as práticas cientificamente reconhecidas. Porém, o fato é que ainda não houve tempo hábil para que a ciência determinasse com segurança qual o melhor tratamento para a COVID-19. Por esse motivo, o Conselho Federal de Medicina (CFM) se manifestou, através do parecer nº 4/2020. Através desse documento, o CFM, apesar de não recomendar, autoriza que o médico prescreva a cloroquina e hidroxicloroquina, mesmo em pacientes com sintomas leves, desde que sob decisão compartilhada com o paciente. Para isso, não basta que o médico obtenha do paciente o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido, é necessário que cumpra, de maneira efetiva, o dever de informar. É preciso deixar claro (e não apenas formalizar no papel), que se trata de um tratamento sem eficácia comprovada, bem como explicar sobre os possíveis efeitos colaterais, os riscos e os benefícios. Ademais, é preciso ter em mente que o Termo de Consentimento não serve como blindagem jurídica para o médico. A obtenção do consentimento, em decisão compartilhada, não exime o profissional de responsabilidade por eventuais danos ocasionados ao paciente. Em 20/05/2020, o Ministério da Saúde divulgou sua recomendação para uso da cloroquina e hidroxicloroquina em pacientes de COVID-19, mesmo em caso de sintomas leves. Trata-se de uma orientação, que não afeta a autonomia do médico assistente para prescrever o tratamento que entender adequado. Em suma, tem-se resguardada a autonomia do médico para deliberar sobre qual o tratamento entende ser o mais adequado, com base nos estudos já divulgados e sempre respeitando o princípio da beneficência. Além disso, deve ser criterioso no que tange a autonomia do paciente e o dever de informação, para que a tomada de decisão compartilhada seja feita de modo consciente. Rodrigo Carlos de Souza, sócio e fundador de Carlos de Souza Advogados, Secretário Geral Adjunto e Corregedor Geral da OAB/ES, Vice-Presidente da Comissão Nacional de Compliance Eleitoral e Partidário da OAB e Diretor do CESA – Centro de Estudos das Sociedades de Advogados (Seccional Espírito Santo). Letícia Stein Carlos de Souza, Acadêmica do 3º. Período da Faculdade de Direito de Vitória e Estagiária de Direito. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória : https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/05/19/autonomia-do-medico-e-o-tratamento-do-paciente-em-casos-de-covid-19/
Neste artigo, vamos falar de um dos feitos ordinários da recuperação judicial, mecanismo da lei que está em franco crescimento no Brasil, algo que se deve aos impactos causados pela pandemia da Covid-19, e que tem o propósito de restaurar empreendimentos afetados pela crise econômica e financeira, mantendo-os com sua fonte produtora intacta, preservando os empregos dos trabalhadores, a função social e o estímulo à atividade econômica. Fora da recuperação judicial os caminhos para o soerguimento do empresário se afunilam, e os riscos à destruição do negócio só aumentam, daí porque falar um pouco sobre um dos efeitos da recuperação judicial, inclusive aqui o mais marcante a nosso sentir, pode, e esse é o propósito, trazer esperança àquele empresário/sociedade empresarial que está passando por um momento difícil, envolto em crise, e até agora não enxergava uma saída para seus problemas. Como em qualquer trabalho técnico e intelectual, o primeiro passo para uma boa chance de se soerguer no mercado pela via da recuperação judicial é buscar o trabalho técnico do advogado que compreenderá o seu dilema, as suas questões, o seu caso, e poderá veicular através do guichê da Justiça o seu pedido de recuperação ao juiz. Assim, o juiz irá analisará toda a exposição fática e documental da situação patrimonial veiculada neste pedido, e, ao deferir o processamento da recuperação judicial em si, consequentemente ordenará por 180 dias renováveis por igual período, a suspensões de ações e execuções disparadas contra o devedor, que pela doutrina especializada leva o nome de stay period, expressão inglesa que significa período de permanência em tradução livre. Afinal, qual é o objetivo deste período de suspensão, para que numa única resposta possamos responder também a indagação contida no título deste artigo? Servir como um auxílio legal ao empreendedor endividado, no afã de que consiga durante este período, com maior segurança, organizar suas atividades e os seus credores, afastando o risco de frustrar isso ao ser atingido por penhora, arresto, sequestro, busca e apreensão, dentre outras medidas constritivas. Ou seja, o stay period é uma condição essencial aos processos de recuperação judicial, sua incidência revela a blindagem legal do patrimônio do devedor, embora não em relação à totalidade das dívidas, eis que nem todas entram na recuperação, mas ainda assim com força necessária para permitir que ele trabalhe com afinco a lavratura de um bom plano de soerguimento com capacidade de atrair os credores para que aprovem-no em assembleia-geral de credores, ponto esse importantíssimo para que ao final de tudo, cumprindo suas obrigações, possa regressar à atividade empresária normal. Raphael Wilson Loureiro Stein é Associado do Escritório desde abril de 2019 e atua nas áreas: Contencioso Civil, Comercial e Recuperação de Empresas e Falência. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/05/18/voce-sabe-o-que-e-o-stay-period-na-recuperacao-judicial/
O assédio moral no ambiente de trabalho se caracteriza, de forma geral, pela prática sistemática e reiterada de atos hostis e abusivos por parte do empregador, ou de preposto seu, em face de determinado trabalhador, com o objetivo específico de atingir sua integridade e dignidade física e/ou psicológica, degradando as condições de trabalho e comprometendo o desenvolvimento da atividade laboral. A moral individual é apresentada pela honra da pessoa, o seu nome, boa fama, sua autoestima e o apreço de que goza perante terceiros. O dano moral, por sua vez, é o resultante de ato ilícito que atinja o patrimônio da pessoa, ferindo sua honra, decoro, crenças políticas e religiosas, paz interior, bom nome, autoestima e liberdade, originando sofrimento psíquico, físico ou moral propriamente dito. Por outro lado, assédio moral, manipulação perversa, terrorismo psicológico ou, ainda, bullying moral, é um mal que, apesar de não ser novo, começa a ganhar destaque na sociologia e medicina do trabalho, estando por merecer também a atenção dos juristas. O assédio é um processo, conjunto de atos, procedimentos destinados a expor a vítima a situações incômodas e humilhantes. De regra, é sutil, no estilo “pé de ouvido”. A agressão aberta permite um revide, desmascara a estratégia insidiosa do agente provocador. O assédio moral, a exposição prolongada e repetitiva do trabalhador a situações humilhantes e vexatórias no trabalho, que atenta contra a sua dignidade ou integridade psíquica ou física é indenizável, no plano patrimonial e moral. Já o assédio sexual por intimidação, também denominado assédio sexual ambiental, caracteriza-se por incitações sexuais inoportunas, solicitações sexuais ou outras manifestações da mesma índole, verbais ou físicas, com o efeito de prejudicar a atuação de uma pessoa ou de criar uma situação ofensiva, hostil, de intimidação ou abuso no ambiente de trabalho em que é intentado, geralmente praticado pelo superior hierárquico. Como regra, a prova do assédio é da vítima, isto é, da pessoa que será a autora da reclamação trabalhista. É necessário que o empregado ou empregada leve, a juízo, elementos mínimos de comprovação da ocorrência do assédio, o que pode ser feito pela existência de mensagens eletrônicas, manifestações verbais, comentários e testemunhas. Não é raro trabalhadores irem à Justiça pleiteando indenização por assédio moral sem que isto tenha ocorrido. Um caso que pode ser citado, ocorrido em outro estado da federação, é de um professor que afirmou ter sido contratado para dar aula para cinco turmas, com remuneração equivalente ao número de aulas e turmas. Logo depois de ter sido contratado, a quantidade de turmas do professor foi reduzida para três, com redução proporcional da remuneração, e ele ingressou com reclamação trabalhista alegando que o ato foi um assédio moral, sob o argumento de que tais reduções (de turmas e salário) trouxeram angústia e sofrimento para ele e a família. A Justiça rejeitou o pedido. Num outro caso, também em local distinto, o trabalhador recebeu um pedido do seu superior e se recusou a atender, alegando questões de princípios. A partir de então, o trabalhador passou a sofrer retaliações, pois os pedidos de compra, por mais urgentes que fossem, só poderiam ser feitos após a autorização da diretoria. Além disso, a diretoria passou a pedir relatórios e inventários de um dia para o outro, os quais não eram de fácil execução. Em ato contínuo, o empregado foi transferido para um setor muito inferior à capacidade dele e do trabalho que já executava. Apesar de ter tido o seu salário preservado, a Justiça entendeu que as retaliações, exigências descabidas e transferência foram um assédio moral contra o trabalhador, e deram uma justa indenização para ele. A fixação do quantum da indenização por dano moral, com base no artigo 944, do Código Civil, compreende decisão por equidade, que deve levar em conta a extensão do dano e o caráter pedagógico-punitivo para o infrator e compensatório para a vítima, não podendo ser meio de enriquecimento nem de ruína para nenhuma das partes. Para a fixação do valor, portanto, o magistrado deve decidir com equidade, observando os princípios da razoabilidade e da proporcionalidade à luz do caso concreto que lhe é submetido, bem como as condições socioeconômicas da vítima e do ofensor. No caso citado acima em que o empregado fez jus a uma indenização, a Justiça concedeu indenização de um salário – o maior recebido pelo obreiro – por ano trabalhado, em dobro. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/05/17/assedios-moral-e-sexual-no-ambiente-de-trabalho-2/
Ontem, o Supremo Tribunal Federal (STF) concluiu o julgamento dos Embargos de Declaração no Recurso Extraordinário (RE) 574706 e decidiu que o Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) a ser excluído da base de cálculo do PIS/Cofins é o destacado na nota fiscal. Também foi decidido que o ICMS deve deixar de ser incluído na base de cálculo das contribuições a partir de 15 de março de 2017, data do julgamento do RE 574706, em que foi apreciado o Tema 69 e fixada a tese de repercussão geral “ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS”. Foram ressalvadas, no entanto, as ações e procedimentos administrativos iniciados em data anterior à decidida. De acordo com a decisão, as empresas que ingressaram com ações em data anterior a 15 de março de 2017 poderão recuperar o que foi pago indevidamente nos anos anteriores. No entanto, as empresas que ingressaram com ações a partir dessa data somente poderão excluir o ICMS da base de cálculo das contribuições para frente, ou seja, de 15 de março de 2017 em diante. A aplicação da modulação dos efeitos da decisão atendeu ao pleito da União Federal e ocorreu sob o manto da segurança jurídica dos órgãos fazendários, já que a tese firmada representou importante modificação do entendimento jurisprudencial em desfavor da Fazenda Nacional. Vale registrar que o Superior Tribunal de Justiça (STJ) havia pacificado entendimento, inclusive em sede de recurso repetitivo, no sentido de manter o ICMS na base de cálculo do PIS e da COFINS. O julgamento do RE 574706 modificou a situação para acolher o pleito dos contribuintes e excluir o ICMS da base de cálculo das contribuições. No entanto, a modulação de efeitos causa estranheza diante do reconhecimento da inconstitucionalidade da cobrança pelo STF. Ainda que a União Federal tenha alegado que o impacto da decisão, sem a modulação de efeitos, pudesse chegar a R$ 245 bilhões, não se justifica impor aos contribuintes o prejuízo. Até porque a União tem o dever legal de fazer provisões oriundas de contingências judiciais, nos termos da Lei de Responsabilidade Fiscal. O provisionamento já poderia ter sido feito, pelo menos, desde 2017, quando foi firmada a tese, ou 2014, quando foi publicada a decisão do RE 240.785, que já evidenciou o posicionamento do STF em favor dos contribuintes. Comemora-se a vitoriosa definição de que o ICMS a ser excluído é aquele destacado na nota fiscal. Muitas empresas tiveram seu direito resguardado com a distribuição de suas ações judiciais e procedimentos administrativos e, embora ainda seja possível recuperar o tributo pago indevidamente, a modulação dos efeitos da decisão representou um duro golpe contra a segurança jurídica que deve permear as relações entre o Fisco e o contribuinte. Mariana Martins Barros é advogada tributária, sócia coordenadora da área tributária do Escritório Carlos de Souza Advogados e membro da Comissão de Direito Tributário da OAB/ES. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/05/14/stf-decide-que-icms-excluido-da-base-de-calculo-do-pis-e-da-cofins-e-o-destacado/
O Presidente da República sancionou ontem, dia 12 de maio de 2021, a Lei nº 14.151/2021 que dispõe sobre o afastamento da empregada gestante de trabalho presencial durante o período de emergência de saúde pública de importância nacional decorrente da pandemia do coronavírus. A Lei possui apenas um único artigo que sintetiza sua essência: Art. 1º Durante a emergência de saúde pública de importância nacional decorrente do novo coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração. Parágrafo único. A empregada afastada nos termos do caput deste artigo ficará à disposição para exercer as atividades em seu domicílio, por meio de teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho a distância. Como se pode observar do art. 1º da referida Lei, durante o período de emergência de saúde pública decorrente da pandemia do coronavírus, a empregada gestante deverá permanecer afastada das atividades de trabalho presencial, sem prejuízo de sua remuneração. Assim, observa-se de antemão que não se trata de uma opção do empregador, mas uma obrigação, independentemente da atividade exercida pelo empregado, pois não há qualquer ressalva na Lei. Assim, o simples fato da empregada estar grávida e estar trabalhando presencialmente já lhe confere o direito de ser afastada de suas atividades presenciais sem prejuízo de sua remuneração. Caberá ao empregador afastar a empregada gestante das atividades presenciais de forma imediata, podendo, contudo, exigir o trabalho em domicílio, teletrabalho, trabalho remoto ou outra forma de trabalho à distância. Considerando a hipótese do empregado, em razão das especificidades de suas atividades não permitir o trabalho à distância, o empregador, de qualquer forma, será obrigado a afastar a empregada garantindo-lhe o pagamento de sua remuneração. Discute-se se diante do texto da lei, seria possível realizar a suspensão ou redução de salário e jornada da gestante nesse período, na forma prevista na MP 1.045/21. O tema ainda está em debate e não se tem uma definição sobre, porém, salvo melhor juízo, não há impedimento legal para isso tendo em vista que a medida provisória 1.045/21, que autoriza a adoção de acordo para redução proporcional da jornada e do salário ou a suspensão temporária do contrato de trabalho, visa tanto a preservação do emprego e da renda do trabalhador, quanto a própria atividade econômica do empregador em razão dos impactos econômicos causados pela pandemia do coronavírus. Outras questões ainda irão surgir e serão temas de intenso debate até que um entendimento seja consolidado. Rodrigo Silva Mello e Roberta Conti R. Caliman, sócios de Carlos de Souza Advogados, são especializados em Direito Trabalhista. Artigo publicado no Jornal Online Folha Vitória: https://www.folhavitoria.com.br/geral/blogs/direito-ao-direito/2021/05/13/sancionada-a-lei-que-determina-o-afastamento-de-gestantes-do-trabalho-presencial/
Meio ambiente é um conjunto de unidades ecológicas que funcionam como um sistema natural, e incluem toda a vegetação, animais, microrganismos, solo, rochas, atmosfera e fenômenos naturais que podem ocorrer em seus limites. Desde sempre, o maior problema do meio ambiente é a sua preservação, ou seja, a forma como o homem usa os recursos naturais. Todos sabem que a destruição ambiental ainda está muito longe de ser equalizada, haja vista os interesses econômicos que, infelizmente, acabam por sobrepor os interesses ambientais. A avaliação do nível de qualidade ambiental está sujeita a interpretações subjetivas e interesses particulares. Contudo, a sociedade não pode estar submetida a interpretações que fujam da razoabilidade e do equilíbrio. Meio ambiente com respeitável nível de qualidade abarca gerações presentes e futuras. Obviamente o ser humano precisa usar o meio ambiente para atender às suas necessidades, e isto inclui causar danos ambientais. O dano ambiental é até aceito, desde que faça parte de um planejamento de desenvolvimento sustentável. Pelo princípio do desenvolvimento sustentável, é estabelecido que temos o direito ao desenvolvimento econômico e social, mas esse desenvolvimento não pode abrir mão da preservação do meio ambiente. Em meio a esse princípio surge a ideia de equidade ou responsabilidade intergeracional, que é a responsabilidade com as presentes e futuras gerações; a manutenção de princípios éticos de diálogo com os filhos e os futuros netos; usar os recursos ambientais hoje, mas com consciência para que as futuras gerações também possam utilizá-los; viver hoje olhando para o futuro. Diante de todo esse cenário, surge um dos principais enfrentamentos ambientais hoje existente: o que fazer com os resíduos sólidos que, até alguns anos atrás, simplesmente eram descartados sem nenhuma maior preocupação. São resíduos sólidos: material, substância, objeto ou bem descartado resultante de atividades humanas em sociedade, a cuja destinação final se procede, se propõe proceder ou se está obrigado a proceder, nos estados sólido ou semissólido, bem como gases contidos em recipientes e líquidos cujas particularidades tornem inviável o seu lançamento na rede pública de esgotos ou em corpos d’água, ou exijam para isso soluções técnica ou economicamente inviáveis em face da melhor tecnologia disponível. Já os rejeitos são resíduos sólidos que, depois de esgotadas todas as possibilidades de tratamento e recuperação por processos tecnológicos disponíveis e economicamente viáveis, não apresentem outra possibilidade que não a disposição final ambientalmente adequada. A Política Nacional de Resíduos Sólidos reúne o conjunto de princípios, objetivos, instrumentos, diretrizes, metas e ações adotados pelo Governo Federal, isoladamente ou em regime de cooperação com Estados, Distrito Federal, Municípios ou particulares, com vistas à gestão integrada e ao gerenciamento ambientalmente adequado dos resíduos sólidos, sendo seus princípios: a prevenção e a precaução; o poluidor-pagador e o protetor-recebedor; a visão sistêmica, na gestão dos resíduos sólidos, que considere as variáveis ambiental, social, cultural, econômica, tecnológica e de saúde pública; o desenvolvimento sustentável; a ecoeficiência, mediante a compatibilização entre o fornecimento, a preços competitivos, de bens e serviços qualificados que satisfaçam as necessidades humanas e tragam qualidade de vida e a redução do impacto ambiental e do consumo de recursos naturais a um nível, no mínimo, equivalente à capacidade de sustentação estimada do planeta; a cooperação entre as diferentes esferas do poder público, o setor empresarial e demais segmentos da sociedade; a responsabilidade compartilhada pelo ciclo de vida dos produtos; o reconhecimento do resíduo sólido reutilizável e reciclável como um bem econômico e de valor social, gerador de trabalho e renda e promotor de cidadania; o respeito às diversidades locais e regionais; o direito da sociedade à informação e ao controle social; a razoabilidade e a proporcionalidade. Sérgio Carlos de Souza, fundador e sócio de Carlos de Souza Advogados, autor dos livros “101 Respostas Sobre Direito Ambiental” e “Guia Jurídico de Marketing Multinível”, especializado em Direito Empresarial, Recuperação de Empresas e Ambiental.
O Tribunal de Justiça de São Paulo, em julgamento de recurso na semana passada, reforçou seu entendimento de que a atriz e modelo Luiza Brunet não possui direito à metade do patrimônio do empresário com quem manteve um relacionamento amoroso, que tentou qualificar como união estável. A intenção da modelo ao ajuizar o processo era ter da Justiça o reconhecimento de que viveu com um empresário uma união estável. Contudo, após instrução probatória das partes em primeira instância, a autora não conseguiu comprovar que o relacionamento se constituía em uma união estável, e consequentemente, não obteve êxito na apuração dos efeitos pretendidos na esfera patrimonial do réu no período em que se relacionaram, de 2012 a 2015. O entendimento do TJSP, apurados os aspectos próprios da relação, é de que o casal manteve um namoro e não a união estável configurada como convivência pública, contínua e duradoura e estabelecida com o objetivo de constituição de família. Atualmente, em função do isolamento social, alguns casais de namorados decidiram morar juntos. Isso significa que o namoro teria evoluído para uma união estável? Trata-se de uma preocupação para muitos casais que optam por “dar este passo a mais” na relação. Para responder tal pergunta é necessário conceituar os dois tipos de relacionamento. A união estável pode ser reconhecida por documento público assinado pelas partes envolvidas, porém, quando este documento não é assinado, cumpre ao Judiciário declarar a existência desta relação com base nos fatos apresentados pelas partes. Neste caso, ausente qualquer documento, é necessário avaliar se a união do casal é marcada pela convivência pública, notória, contínua e com desejo de constituir família. O namoro qualificado, por sua vez, se caracteriza por uma evolução do relacionamento, que adentra a uma nova fase, em que as pessoas estão juntas, desejam estar juntas, mas não têm a intenção de constituir uma família, pelo menos não ainda, naquele exato momento da relação. Portanto, o simples fato de se morar junto não caracteriza a união estável, ao passo que é possível morar em casas separadas e haver uma estabilidade da relação suficiente para caracterizá-la como união estável. Afinal, a significativa subjetividade que envolve o tema tem influenciado muitas pessoas a procurarem a Justiça para definir o tipo de relação e seus efeitos no patrimônio do casal. Em 2015, o Superior Tribunal de Justiça precisou enfrentar o tema e passou a entender que o “namoro qualificado” é aquele em que o casal até convive sob o mesmo teto, mas não enseja o direito de partilha dos bens adquiridos neste período por um dos namorados. Naquela oportunidade, o ministro Marco Aurélio Bellizze, da Terceira Turma do STJ, entendeu que não houve união estável, “mas sim namoro qualificado, em que, em virtude do estreitamento do relacionamento, projetaram, para o futuro, e não para o presente, o propósito de constituir entidade familiar”, e nem o fato de ter existido a coabitação do casal foi suficiente para evidenciar uma união estável, já que a convivência no mesmo imóvel se deu apenas por conveniência de ambos, em razão de seus interesses particulares à época. Na esteira deste entendimento, o TJSP entendeu como namoro qualificado o caso da modelo e do empresário, pois não estava presente a intenção de constituir família naquele momento do relacionamento. Com efeito, notou-se que, apesar do longo e duradouro relacionamento, se tratavam, eram conhecidos e reconhecidos no meio em que viviam apenas como namorados. Fato é que, em tempos de pandemia, a conveniência tem ditado a coabitação de alguns casais de namorados, o que não significa que tenham evoluído para uma estabilidade tal na relação que possa ser considerada união estável, com efeitos patrimoniais, e sim, na maioria dos casos, trata-se de um namoro qualificado, que progrediu para a coabitação diante do cenário inédito da Covid-19. Aconselha-se, inclusive, que o casal de namorados deixe isso bem claro para familiares, amigos e até nas redes sociais: a coabitação é, no momento, conveniente para o relacionamento, que continua sendo um namoro, sem a intenção, pelo menos naquele instante, de constituição de uma família e de um patrimônio comum. Chrisciana Oliveira Mello, sócia de Carlos de Souza Advogados, aluna especial do curso de mestrado em Processo Civil da Universidade Federal do Espírito Santo.
A resposta é depende! Muitos têm a impressão de que toda e qualquer consulta eletiva realizada em consultório médico confere ao paciente o direito de retorno, sem ônus, pelo prazo de 30 dias. Mas a verdade não é bem essa! O Conselho Federal de Medicina (CFM) regulamentou, através da Resolução nº 1.958, de 15 de Dezembro de 2010, o ato da consulta médica, a possibilidade de sua complementação e reconheceu ser do médico assistente a identificação das hipóteses em que poderá haver ou não a cobrança de novos honorários. De início a Resolução nº 1.958 do CFM já traz em seu artigo 1º a clara definição de consulta médica como sendo o ato que “compreende a anamnese, o exame físico e a elaboração de hipóteses ou conclusões diagnósticas, solicitação de exames complementares, quando necessários, e prescrição terapêutica como ato médico completo e que pode ser concluído ou não em um único momento”. Já nos parágrafos seguintes há o esboço das hipóteses em que poderá haver ou não a cobrança de nova remuneração pelo profissional. Dispõe o legislador que havendo necessidade de realização de exames complementares que não possam ser analisados na mesma consulta, o ato terá sua continuação em momento posterior em tempo determinado a critério do médico, não gerando cobrança de honorário. Veja que o texto da Resolução do CFM não institui um prazo máximo (como muitos acreditam ser de 30 dias) para que o retorno sem ônus ao paciente ocorra, competindo ao profissional a sinalização dentro de suas possibilidades para atendimento. Merece destaque o fato de que a Resolução menciona que o retorno não oneroso é tão somente para verificação de exames solicitados. Descreve ainda que mesmo dentro da hipótese acima (apreciação de exames), existe a possibilidade do atendimento de distinta doença no mesmo paciente, o que caracteriza novo ato profissional passível de cobrança de novos honorários médicos. A Resolução diz ainda que no caso de alteração de sintomas/sinais que requeiram nova anamnese, exame físico, hipótese ou conclusão diagnóstica e prescrição de tratamento, o procedimento deverá ser considerado como nova consulta e dessa forma deve ser cobrada/remunerada. De igual forma ocorre com a hipótese de doenças que requeiram tratamentos prolongados com reavaliações e até modificações terapêuticas, consultas estas que podem ser ou não cobradas a critério do médico assistente. Importante destacar que a Resolução confere ao médico assistente, e apenas a ele, a identificação das hipóteses de nova cobrança ou não por retorno, quando do atendimento, vedando a terceiros o estabelecimento de prazos específicos que interfiram na autonomia do médico e na relação deste com o paciente, nem estabelecer prazo de intervalo entre consultas. Rovena Roberta S. Locatelli Dias, sócia de Carlos de Souza Advogados, especializada em Direito Civil, Médico, Comercial e Imobiliário.

